
Embora subestimadas, a cobrança das generalidades no frete são fundamentais para refletir com precisão a complexidade real da operação logística
*Por Raquel Serini
No competitivo e desafiador setor do Transporte Rodoviário de Cargas (TRC), cada centavo conta. Com o constante aumento dos custos operacionais — como diesel, manutenção e pedágios — e a pressão do mercado por menores preços, muitos transportadores acabam aceitando fretes abaixo do necessário para garantir a sobrevivência da operação. O resultado é previsível: margens de lucro apertadas, frota defasada, endividamento e, em muitos casos, abandono da atividade.
Porém, existe um caminho muitas vezes negligenciado que pode ajudar a equilibrar a balança financeira das transportadoras: as generalidades no frete, também chamadas de taxas acessórias ou serviços adicionais. Embora subestimadas, essas cobranças são fundamentais para refletir com precisão a complexidade real da operação logística.
Cada carga possui particularidades que vão muito além do trajeto entre origem e destino. Entregar em áreas com restrição de circulação, aguardar horas para descarga, contratar ajudantes locais, realizar reentregas ou operar em caráter emergencial são somente alguns exemplos de situações que geram custos adicionais.
Se esses fatores não forem considerados e cobrados de forma apropriada, o transportador assume um prejuízo silencioso e recorrente.
Este artigo se propõe a esclarecer a função das generalidades na formação do preço do frete, demonstrar como aplicá-las corretamente e, acima de tudo, mostrar que essas taxas podem ser não apenas mecanismos de compensação, mas estratégias legítimas para proteger e, até aumentar, a lucratividade da empresa de transporte.
O que são as Generalidades?
Generalidades são taxas que cobrem serviços ou condições especiais da operação de transporte. Elas são justificadas, legítimas e negociáveis com o cliente. E compensam particularidades que aumentam o custo do transporte, como:
- TDE – Taxa de Dificuldade de Entrega: comum em áreas urbanas com restrição de acesso. (*Sugestão de cobrança: 40% sobre o frete original ou para fretes até R$ 554,96 cobrar R$221,98 por conhecimento).
- TPD – Taxa para Pagamento de Descargas: contratação de terceiros para descarregar a mercadoria. (Sugestão de cobrança: por unidade ou volume ou mediante a apresentação do documento fiscal ou recibo fornecido pelo prestador do serviço acrescido dos impostos federais e despesas administrativas).
- Estadia do Veículo: tempo de espera para carga ou descarga fora do prazo. (*Sugestão de cobrança: R$ 2,41 ton/hora a partir da 5° hora).
- EMEX – Emergência Excepcional: acréscimos por operação crítica ou região sensível como o Rio de Janeiro. (*Sugestão de cobrança: 0,3% a 1% sobre o valor da mercadoria ou R$ 18,39 a cada 100Kg ou fração).
- TRT – Taxa de Restrição ao Trânsito: quando o transporte é impactado por leis de restrição municipal. Confira o Guia de Restrições em Áreas Metropolitanas, clique e saiba mais. (*Sugestão de cobrança para SP e RJ: 20% sobre o frete original ou para fretes até R$ 469,79 cobrar R$ 93,96 por conhecimento. Para as demais cidades 15% sobre o frete original ou para fretes até R$ 323,24 cobrar R$ 48,49 por conhecimento).
*Valores de referência tem como base abril de 2025.
Exemplo prático:
Vamos considerar o transporte de eletrodomésticos entre São Paulo e Rio de Janeiro, em área urbana com restrições, com valor de carga de R$ 220.000 e distância de 520 km. O custo peso da viagem gira em torno de R$ 3.500,00, veja o impacto das generalidades no custo final:
Item | Valor R$ | Descrição |
Custo peso | 3.500,00 | Custo operacional |
Custo valor (0,6%) | 1.100,00 | Despesas não abarcadas pelo seguro |
GRIS (0,3%) | 660,00 | Gerenciamento de Risco |
TSO (0,20%) | 400,00 | Taxa de Seguro Obrigatório |
Pedágio (ida e volta) | 210,00 | – |
Subtotal | R$ 5.870,00 | – |
TRT (20%) | 350,00 | Área com restrição de horário e veículo (Niterói) |
TDE (40%) | 280,00 | Acesso limitado para descarga (escadas) |
TPD (R$/veículo) | 450,00 | Necessidade de ajudante local, valor estabelecido pelo recebedor |
EMEX (0,3%) | 600,00 | Área de beligerância e risco de roubo de carga |
Total com generalidades | R$ 7.550,00 | – |
Fonte: elaborado pela autora (simulação sem margem de lucro e custo financeiro)
Neste caso, enquanto o custo peso representa cerca de 78% do total, as generalidades compõem mais de 20% da receita. Se bem geridas, essas taxas tornam-se uma fonte de recuperação tarifária e até incremento de margem de lucro, especialmente quando o valor básico do frete está defasado ou em negociação agressiva.
Como capitalizar com as generalidades?
- Mapeie as operações com clareza: saiba se a entrega envolve reentregas, se é rural ou em zonas com restrição de trânsito.
- Documente e comprove: toda cobrança de generalidade deve estar prevista em contrato, proposta comercial ou CT-e e ser passível de comprovação (tempo parado, endereço, laudo, etc).
- Educação tarifária com o cliente: explique que o custo de uma descarga terceirizada, por exemplo, não pode ser absorvido pela transportadora. Muitos embarcadores aceitam essas taxas, desde que fundamentadas.
- Capilaridade comercial: pequenos valores agregados em cada frete, como R$ 250 de EMEX, ou R$ 300 de estadia, quando bem aplicados, podem representar até 20% do lucro operacional da empresa.
Portanto, quem cobra generalidades corre menos riscos. O transportador se protege de prejuízos operacionais e aumenta a rentabilidade. Ignorar essas taxas é subsidiar parte da logística do cliente. Já incorporá-las ao frete de forma profissional é sinal de maturidade empresarial.
A pergunta que fica é: O que você fará a partir de hoje para cobrar um frete ainda mais justo???
Se tiver dúvidas sobre como aplicar as taxas de generalidades entre em contato com o serviço de Planejamento de Custos e Tarifas do SETCESP pelo e-mail: economia@setcesp.org.br ou WhatsApp: (11) 2632-1000 .
E lembre-se: se for bom e rápido, nunca será barato. Pense nisso.
*Raquel Serini é coordenadora de projetos do IPTC (Instituto Paulista do Transporte de Cargas).
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