Companhias querem atrair mais jovens
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Envelhecimento da população brasileira aliado à mudança de comportamento da geração Z cria desafios para trazer e manter os mais novos

A população brasileira está envelhecendo e, com isso, a força de trabalho também. Com menos jovens disponíveis e uma mudança de comportamento da geração Z – que hoje tem de 15 a 28 anos – em relação ao mercado de trabalho, o desafio de atrair e reter esses profissionais está posto às organizações.

Segundo dados da PNAD Contínua, do IBGE, referentes ao terceiro trimestre de 2024, o Brasil possui aproximadamente 33,7 milhões de jovens entre 15 e 24 anos, o que equivale a 19% da população em idade para trabalhar (PIA). No mesmo período de 2012, esse grupo representava 24% da PIA.

Uma outro dado, do ManpowerGroup, de soluções para recursos humanos, mostra que 23% da força de trabalho brasileira em 2024 era composta por pessoas da geração Z. Um pouco mais velhos, os profissionais da geração Y (de 29 a 43 anos) somavam 25% do total, e os da X (de 44 a 60 anos), 20%. Baby boomers (mais de 61 anos) totalizavam 16%. Foram analisados dados de 108 milhões de trabalhadores do país.

E quando se analisa a demografia histórica do ranking das Melhores Empresas para Trabalhar no Brasil, organizado pelo Great Place to Work (GPTW), observa-se uma significativa mudança na contratação por faixa etária. Em 2006, por exemplo, os profissionais com até 25 anos representam 32% da força de trabalho das melhores empresas. Em 2024, eles representavam apenas 19%. Na outra ponta, profissionais entre 35 e 44 anos que representavam 25% dos profissionais das melhores empresas em 2006, hoje representam 31%. Esse crescimento também é observado nas faixas seguintes. Entre 45 e 54 anos houve um aumento de 9% para 13% no período. Acima de 55 anos, aumento de 1% para 4%.

“Um reflexo do envelhecimento populacional e de práticas também voltadas à inclusão de pessoas mais experientes nas empresas”, pontua Daniela Diniz, diretora de conteúdo e relações internacionais do escossistema Great People, do qual o GPTW faz parte. Diniz cita algumas hipóteses para essa queda, com base em pesquisas internacionais e no Relatório de Tendências de Gestão de Pessoas do Great People, que há sete anos acompanha desafios e prioridades da agenda de pessoas.

 “Após um boom nos dois primeiros anos da pandemia, o setor de TI iniciou uma série de ‘lay-offs’. As ‘big tech’, especialmente, entraram em evidência com suas demissões em massa, mandando embora muitos jovens nesse processo e reorganizando suas estruturas. Isso é um ponto importante que explica a queda no número de profissionais nessa faixas etária”, diz.

Ela complementa afirmando que as mudanças em algumas políticas e práticas do setor nesse mesmo período – como o retorno de algumas empresas ao modelo presencial – podem contribuir também para a diminuição de jovens, “que têm a flexibilidade como um critério importante na busca por emprego – especialmente o profissional de TI”.

Na Cisco, uma multinacional americana de tecnologia com cerca de 400 funcionários no Brasil, 4% do quadro tem até 25 anos de idade. Daniela Glezer, líder de recrutamento da Cisco para América Latina, comenta que o setor de tecnologia é, sim, atraente para os jovens, mas pontua que a escolha de emprego atualmente está muito fundamentada nas necessidades individuais quanto à saúde e bem-estar. Ela lista alguns requisitos buscados por essa faixa etária, na seguinte ordem de importância, segundo sua percepção: equilíbrio entre vida pessoal e profissional, incluindo a discussão sobre trabalho remoto versus presencial e horário de trabalho flexível, onde haja espaço para autonomia de decisão e sobre o manejo das tarefas diárias; cultura organizacional, com valores corporativos alinhados aos valores pessoais; propósito, com responsabilidade social e sustentabilidade sendo temas centrais; saúde mental; carreira, abarcando a possibilidade de desenvolvimento profissional; e remuneração e benefícios.

Na Equinix, empresa de data centers e tecnologias de rede corporativa, o percentual de jovens até 25 anos entre os cerca de mil funcionários é de 10%, incluindo aprendizes e estagiários. Para atrair a geração Z, a companhia adota política de contrato flexível (trabalho híbrido, presencial ou remoto) conforme a atividade a ser executada, oportunidade de contato com times globais e programas de desenvolvimento de carreira. “O setor de tecnologia, sem dúvida, exerce um grande fascínio sobre os jovens profissionais”, afirma Victor Arnaud, presidente da Equinix no Brasil. “No entanto, é fundamental reconhecer que a concorrência por talentos nesse setor é acirrada, e precisamos nos manter interessantes para reter esses talentos conosco.”

Ainda segundo dados do GPTW, há mais um setor – empatado com tecnologia – com o mais baixo índice de jovens na força de trabalho (13%): a indústria. Mas, nesse caso, a queda foi menos acentuada, já que essa parcela representava 15% do total em 2022.

Com um bacharelado em Gestão da Cadeia de Suprimentos e Logística pela Universidade Nove de Julho, Aliny da Silva, 24 anos, ocupa a função de técnico logística na Scania, e comenta que escolheu a indústria para trabalhar porque se trata de um setor que cresce e tem tecnologias atuais e oportunidades de emprego. “A Scania, por sua vez, é uma montadora de grande nome, uma multinacional que conta com plano de carreira e oportunidades internacionais”, diz. “Além de diversos benefícios, é uma empresa que preza temas como segurança, saúde e inclusão de seu colaborador.”

Ela está há pouco mais de dois anos na companhia, e sua função consiste no manuseio de equipamentos como empilhadeira elétrica, a gás e carrinho elétrico. “Armazeno e transporto materiais até a fábrica de solda, materiais em seu estado bruto, como portas, teto e assoalho”, detalha, dizendo que também faz o pedido de peças de acordo com a demanda diária, desde peças maiores até porcas e parafusos.

A fabricante sueca de caminhões e ônibus viu a parcela de profissionais com até 29 anos subir de forma expressiva nos últimos anos. Hoje, representa 21% do quadro de 5.642 pessoas, ante 6% em 2017. Os programas de jovem aprendiz, estágio e trainee são as principais portas de entrada para esse público.

“Para atrair esses profissionais, realizamos diversas parcerias com universidades ao longo do ano, promovendo feiras de carreira, palestras, cursos e workshops sobre temas como inteligência artificial, tecnologia, dados e combustíveis alternativos, entre outros”, explica Jéssica Fernandes, gerente de recrutamento, seleção e marca empregadora da Scania Operações Industriais na América Latina. “Esses eventos são ministrados dentro das universidades por profissionais que trabalham na Scania”. A empresa também faz campanhas de atração em redes como Instagram e LinkedIn.

Fernandes comenta que se antes a indústria era muitas vezes a única opção do jovem profissional, hoje precisa se apresentar a esse público. “Há uma parte que nem sabe o que a empresa oferece”, diz. “No entanto, após uma palestra ou um bate-papo em um estande de feira de carreiras com um profissional da área, por exemplo, o jovem muda sua percepção sobre o setor e começa a considerar a indústria como uma excelente oportunidade para sua carreira.”

Diniz, do Great People, diz que a indústria enfrenta desafios para atrair e reter jovens pela falta de flexibilidade e por uma percepção de falta de segurança física e psicológica e de que ainda predominam no setor gestores que atuam no antigo modelo de comando e controle, que não conversam e investem pouco no desenvolvimento dos mais novos. “No geral, as empresas [da indústria] que têm se destacado nessa busca e permanência de jovens são aquelas que estão desconstruindo o tradicional modelo de gestão industrial, se tornando mais abertas, flexíveis e acolhedoras”, afirma.

No Grupo Tigre, indústria de materiais hidráulicos, os profissionais até 25 anos representam 10,99% dos cerca de 5 mil funcionários – um pequeno aumento em relação a 2023, quando representavam 9,47% do total. Para atrair os jovens, a empresa também aposta em programas como aprendiz e estágio, ações no LinkedIn e em universidades, reforço da marca empregadora e apresentação de caminhos de carreira diversificados. “Embora o setor industrial seja reconhecido por sua inovação e tecnologia, atraindo jovens profissionais de áreas técnicas como engenharia, ainda enfrentamos desafios para conquistar talentos em outras áreas produtivas”, diz Juliano Pereira, diretor de pessoas, sustentabilidade e comunicação interna na Tigre. Para ele, a indústria ainda carrega a percepção de ser tradicional e distante das demandas atuais, o que gera um desafio para atrair os jovens. “Mostrar como a indústria está evoluindo para atender temas como economia circular, inclusão e impacto ambiental positivo é essencial para atrair esse público.”


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