Marinaldo Reis: ‘O mínimo de conforto enquanto aguarda’
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Como diretor da especialidade de abastecimento e distribuição do SETCESP, Marinaldo acompanha há anos estudos sobre procedimentos, infraestrutura e o tempo para a descarga em polos recebedores de São Paulo e região metropolitana, avaliando como ninguém, as necessidades do transporte para o abastecimento urbano

Como você ingressou no setor de transporte? Conte-nos por favor sua trajetória profissional.

Iniciei em 1994, trabalhando como conferente em uma empresa pequena de transporte de carga fracionada. Depois fui para uma transportadora de grande porte na área de controle operacional, nos anos seguintes fui supervisor, gerente de filial, gerente comercial até sair de lá para fundar em 2002, com mais dois sócios, a Renascer Express onde sou o diretor comercial.

Assim que fundamos a nossa empresa, nos associamos ao SETCESP e comecei a participar das reuniões da CAD (Comissão de Abastecimento e Distribuição), que se tornou anos mais tarde a Diretoria de Abastecimento e Distribuição. Em 2016, assumi a coordenação dessa diretoria a convite do ex-presidente Tayguara Helou e, depois em 2019, fui convidado para ser o secretário geral do SETCESP. Agora, na gestão do presidente Adriano Depentor, eu permaneci com estas mesmas atribuições no sindicato.

De que forma os procedimentos de recebimento de cargas nas lojas ou em centros de distribuição interferem na produtividade das empresas de transporte?

Impacta nos custos, quanto maior o tempo do veículo parado maior será o custo. E isso não é só para a transportadora, mas para toda a cadeia logística e de abastecimento. Outro ponto é que um grande estabelecimento que não tem a infraestrutura adequada é capaz de causar um enorme transtorno a quem está à sua volta. Os caminhões estacionados aguardando a vez para descarregar geram mais barulhos e congestionamentos, ou seja, atrapalha a dinâmica da comunidade.

Qual o maior desafio atualmente para quem faz o transporte de cargas urbano?

Nós temos um grande problema com as janelas de horário de entregas que são muito pequenas, principalmente nos shoppings centers, elas são concentradas na parte da manhã. No caso do varejo de rua, o maior desafio é a infraestrutura. Nestes locais é comum acontecer de o veículo dar duas, três voltas no quarteirão para achar um lugar para parar e descarregar, nisso tudo ele gera mais calor, mais emissão de gás carbônico e mais trânsito.  Esta é uma das razões pela qual temos um trabalho de pesquisa junto ao IPTC (Instituto Paulista do Transporte de Carga) a fim de mapear as vagas de cargas e descarga na região central. Levamos esses estudos ao poder público para buscar melhorias de infraestrutura para o transportador, o que reflete também em melhoria na fluidez do trânsito na região.

Acha que as entregas noturnas são uma opção a ser considerada?

Elas já existem, só que em menor escala e em grandes estabelecimentos que tem como arcar com o custo de uma equipe noturna para receber esta carga. Agora, isso no caso do varejo é mais complicado, porque não há infraestrutura e condições de dispor de mão de obra para fazer o recebimento neste período, sem falar na segurança também. Pensando na questão de custo, isto seria muito difícil de implantar.

Que boas práticas deveriam ser consideradas nos estabelecimentos tanto para o recebimento quanto de distribuição?

Primeiro, é importante que eles estejam atualizados tecnologicamente para agilizar a documentação e a troca de arquivos entre embarcador e recebedor. Nem sempre acontece de você chegar nos estabelecimentos e o recebedor já estar com o XML da nota fiscal, e isso dificulta muito o processo. Outros fatores seriam proporcionar uma infraestrutura razoável para a pessoa que vai descarregar e o aperfeiçoamento de procedimentos internos, como por exemplo, a devolução de canhotos.

Uma coisa que o recebedor tem que entender é que o transportador não pode aguardar o processo de conferência da carga item a item, a exigência disso é uma prática horrível. A devolução parcial também é uma boa prática que se o pessoal incorporar nos ajudará. Às vezes por conta de uma peça, o recebedor quer devolver a carga toda.

O tempo médio para descarga aumentou 38 minutos em 2023. O que isso significa na prática para uma transportadora?

Toda vez que vemos o aumento no tempo, a gente recebe a notícia com um pouco de apreensão. Embora, se considerarmos que, nos últimos anos, a gente teve uma queda do tempo também influenciado pela pandemia, agora com a recuperação da atividade econômica e da movimentação de cargas, eu até vejo esse aumento com uma certa naturalidade. Mesmo assim, como próprio Instituto que realiza a pesquisa aponta, esses 38 minutos de aumento médio significam 20% do aumento de custo da hora parada, o que é bastante considerável.

O que esperamos é que mediante ao aumento da movimentação, os pontos recebedores enxerguem a necessidade de recomporem suas equipes para agilizar o trabalho de descarga.

Que fatores externos contribuem para o atraso no recebimento?

Tem uma questão comercial pouco comentada, mas que impacta muito. A maioria dos recebedores quer centralizar o recebimento na segunda quinzena do mês. Esse fator externo gera uma quantidade enorme de recebimentos por apenas um período e excede a capacidade de atendimento do polo recebedor. Estas grandes redes se aproveitam também das chamadas ‘compras de oportunidades’, mas aí os CDs (Centros de Distribuição) não estão esperando tal carregamento comprado, e não tem como planejar o acondicionamento, resultado disso, é que acaba sobrando para o transportador, que fica submetido a uma espera para poder descarregar.

Mesmo com esse último aumento, obviamente, já houveram avanços. O que se pode destacar como principais mudanças que ocorreram ao longo dos anos nos pontos recebedores?

Nós tivemos uma melhora substancial, principalmente, na questão de infraestrutura. Há 15 anos atrás, a coisa era bem precária, tanto que isso era a principal reclamação das empresas que participavam da Diretoria de Abastecimento e Distribuição. Desde então, o SETCESP tem se aproximado mais dos grandes CDs e avançamos muito, para melhorar os locais para a tripulação, ainda assim, há espaço para avançar mais. Vale dizer que a formalização do pagamento das descargas nesses recebedores também melhorou.

Como você avalia a metodologia da pesquisa IER realizada pelo IPTC a pedido do SETCESP?

A metodologia é ótima, porque tem como premissa três pilares do recebimento: a infraestrutura, o procedimento e o tempo médio.  A infraestrutura, porque é preciso garantir que a nossa tripulação tenha banheiros, bebedouros e um local para estacionar, não se trata de ter a disposição algo que se compare a um hotel cinco estrelas, mas o mínimo de segurança e conforto enquanto aguarda o descarregamento da carga. O procedimento, porque sabemos que os agendamentos e as devoluções parciais otimizam o processo e o tempo em si, se traduz em custo e produtividade.

Como é a atuação da Diretoria de Abastecimento e Distribuição do SETCESP?

Ela é composta por empresários, executivos e profissionais que lidam com o transporte de cargas fracionadas para o abastecimento urbano, o pessoal que faz entregas para as grandes redes varejistas e que atuam com os Centros de Distribuição. A diretoria trabalha acolhendo as demandas destas empresas e procura discutir melhorias com os pontos recebedores, além de estar próxima desses estabelecimentos para ajudar a resolver os problemas que surgem na operação.

Esse trabalho de relacionamento abre caminho para o serviço de Apoio Operacional do SETCESP, para que quando surja um problema específico de algum de nossos associados, a equipe do Apoio Operacional possa intermediar a demanda e encontrar uma solução. Fora isso, a pedido da diretoria, temos a pesquisa do IER encomendada pelo SETCESP ao IPTC em que o resultado é uma análise profunda dos procedimentos, e parte dos seus efeitos é o evento de premiação de melhor IER.

Que recado gostaria de deixar para os transportadores?

O SETCESP vem trabalhando ao longo dos anos em busca de melhorias para as empresas de vários segmentos de transporte. A função da nossa diretoria é exatamente facilitar as operações e diminuir custos para as empresas, contribuindo ainda, para que as cidades tenham todo o abastecimento necessário e mais mobilidade.

Aproveito para reforçar o pedido para que os empresários tenham a consciência de fazer uma cobrança justa pelo seu serviço, porque se ele não fizer isso, ele não conseguirá manter a estrutura de sua empresa de maneira sadia. O lucro é o que dá a perenidade às empresas, então precifiquem de maneira justa e valorizem o seu trabalho.


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