Alta do IOF: como isso impacta a sua transportadora
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O aumento da alíquota gerou embate entre os poderes e pressiona custos do setor

Cada quilômetro rodado tem o seu custo para as empresas de transporte rodoviário de cargas no Brasil. A nova alta do IOF chega como mais um peso já na alta carga tributária que o caminhão tem de carregar. O Imposto sobre Operações Financeiras, que incide sobre operações de crédito e câmbio, deixará as estradas mais onerosas para transportadoras e, também, consumidores.

“Usou o limite no cheque especial? Pediu empréstimo? Fez uma aplicação financeira e quer resgatar fora do prazo? — Vai pagar mais IOF. Tudo passa pelo custo do dinheiro”, explica a economista do SETCESP e coordenadora do IPTC, Raquel Serini.

A nova alíquota aumentou o custo de antecipação de recebíveis, compras internacionais e outras transações financeiras. Já está valendo, desde o dia 16 de julho, quando o STF deu ganho parcial ao governo, mantendo integral ou parcialmente alguns pontos do decreto nº 12.466/2025, assinado pelo presidente da República em 23 de maio.

Embate entre poderes

Sim, você não leu errado. O decreto só passou a vigorar com uma decisão do Supremo Tribunal Federal, porque antes, houve uma queda de braço entre os poderes Executivo e o Legislativo. O Congresso tentou suspender a medida, porém não conseguiu.

Para uma melhor compreensão, o assessor jurídico do SETCESP, Marcos Aurélio Ribeiro, detalha como uma decisão, que deveria ser tomada apenas por quem governa, foi desta vez, definida por quem julga.

“IOF é um imposto de caráter regulatório, portanto não deveria ser utilizado visando aumentar a arrecadação. Diferentemente dos demais tributos, ele tem vigência imediata e pode ter sua alíquota alterada por decreto presidencial, sem necessidade de aprovação do Congresso Nacional, algo que não ocorre com os outros impostos, que só podem ser modificados por meio de lei”, informa o assessor.

 “O aumento, puro e simplesmente, foi para elevar a arrecadação, porque o governo tem um déficit de 30 bilhões”

Só que justamente por ter esse caráter regulatório, o Congresso entendeu que o decreto do presidente da República aumentando o IOF feria a Constituição, porque o imposto não poderia ser aumentado com a finalidade de aumento da arrecadação.

“Quando o governo altera uma política desta forma, surgem dois efeitos: de um lado, há a geração da receita; do outro, cria-se instabilidade política e desconfiança em relação ao governo, especialmente entre investidores, que reagem negativamente ao aumento de impostos sobre as transações”, destaca a economista.

Ribeiro conta que era preciso justificar o caráter regulatório do aumento. “Nesse caso, não foi justificado nada. O aumento, puro e simplesmente, foi para elevar a receita, porque o governo tem um déficit de 30 bilhões e precisa aumentar a arrecadação rapidamente, e qual imposto permite o aumento de imediato? — Sim, o IOF.

Quando isso ocorreu, houve uma reação generalizada dos agentes econômicos e setores produtivos que se manifestaram contra o aumento do IOF, alegando que o decreto era inconstitucional. A pressão foi de todos os lados.

Em nota, a NTC&Logística afirmou que para o transporte de cargas a medida “inibe investimentos e fragiliza ainda mais o setor, essencial para o funcionamento das atividades econômicas de produção, distribuição e abastecimento no país”.

No mesmo sentido, a Confederação Nacional do Transporte (CNT) publicou um posicionamento afirmando que “o equilíbrio das contas públicas depende, necessariamente, da responsabilidade no uso dos recursos e da adoção de medidas estruturantes, como a reforma administrativa”.

A partir de toda essa pressão, o Congresso aprovou um projeto de decreto legislativo para revogar o decreto do presidente da República. A decisão do executivo perdeu seus efeitos, valendo as alíquotas anteriores. Esta situação durou menos de uma semana.

O poder executivo não deixou por isso mesmo, e ingressou no Supremo com uma ação para declarar a Constitucionalidade do decreto presidencial. A ação do caso foi direcionada ao ministro Alexandre de Moraes que, quando recebeu as duas ações, deu um despacho suspendendo ambos os decretos: o do legislativo e do executivo.

“Será o consumidor final que pagará essa conta, porque a logística e a produção ficam mais caras, e por consequência os produtos nas prateleiras também”

Supremo bate o martelo

Mas em poucos dias, uma nova decisão do ministro reconheceu que o executivo pode alterar a alíquota do IOF com caráter regulatório, independentemente da justificativa.

“Diante desse entendimento, nada mais impede que o executivo possa constitucionalmente aumentar o imposto, a única coisa que o ministro vetou foi o aumento na operação de risco sacado, por entender que essa operação não tem uma previsão legal da incidência”, conta Ribeiro.

“Uma coisa é quem poupa e outra quem pega empréstimo”, pontua Serini. “Se você pune todo mundo igual, cria uma disparidade. Por isso ficou de fora a operação de risco sacado”, esclarece.

Efeito cascata

Para um setor de margens já apertadas, o impacto deste aumento é direto. Transportadoras dependem de leasing, financiamentos e antecipação de recebíveis para sustentar o fluxo de caixa, já que o prazo médio para recebimento é por volta de 120 dias.

“Com IOF mais alto, aumenta o custo do capital de giro, da renovação da frota e dos investimentos em implementos”, aponta o presidente do SETCESP, Marcelo Rodrigues. “Qualquer variação pode inviabilizar a operação. Cada centavo por quilômetro conta”, diz.

Empresas mais vulneráveis, com pouco acesso ao crédito, encontram dificuldades para investir na renovação da frota. A alternativa acaba sendo manter veículos mais antigos, que geram custos maiores de manutenção. Um ciclo que fragiliza toda a cadeia produtiva.

“O veículo e o implemento são os principais ativos do transporte. Não tenho dúvidas de que eles estariam entre as prioridades de investimento das empresas caso a alíquota do IOF tivesse sido mantida”, afirma o presidente.

“Pensando no geral, será o consumidor final que pagará essa conta, porque a logística e a produção ficam mais caras, e por consequência os produtos nas prateleiras também. Embora pareça um imposto distante, ele afeta diretamente o consumidor”, avalia Serini.

“Com IOF mais alto, aumenta o custo do capital de giro, da renovação da frota e dos investimentos em implementos”

“Temos uma atividade que consome quantidade enorme de insumos e que gera muitos empregos. Se a atividade de transporte pudesse ser isenta de IOF, com certeza geraríamos mais empregos com maiores investimentos”, considera Rodrigues.

Está valendo

Apesar de existirem bons motivos para o governo recuar, especialistas acreditam que isso não deve acontecer.

“O Congresso poderia até aprovar uma lei para alterar a legislação do IOF, mas a mudança só teria efeito a partir da sua entrada em vigor, e ainda assim dependeria da aprovação do presidente da República”, pondera o assessor.

Do ponto de vista da economista, a curto e médio prazo, o governo deve manter o aumento do IOF como está. No entanto, a longo prazo, se a arrecadação ainda não atingir o esperado para equilibrar as contas públicas, o imposto pode ser elevado novamente, inclusive alcançando outras operações financeiras. “Na minha opinião, essa porta já se abriu: você aumentou para uma parte, então elevar para o restante é uma questão de tempo”.

“O grande problema do imposto no Brasil é que quando passa a valer não dá para saber quando sai ou diminui”, avalia também Ribeiro.


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