Depois de meses de uma maratona legislativa, a reforma da Previdência foi aprovada e aguarda a promulgação do Congresso Nacional para entrar em vigor. Apesar de, na prática, as novas regras ainda não estarem em vigor, é preciso conviver com as mudanças na aposentadoria que tende a ficar mais distante e com benefícios menores. Nesse contexto, a previdência complementar, produto que já está na prateleira de bancos ou é oferecido por empresas, ganha espaço. Mas, antes de sair contratando uma previdência privada, é necessário saber como ela funciona.
Para Arlete Nese, doutora em administração e co-autora do livro “Fundamentos da Previdência Complementar” escrito em parceria com o economista Fábio Giambiagi, é necessário conhecer os conceitos dos produtos antes de contratar. Antes de tudo, a especialista afirma que é preciso tratar a previdência complementar como um seguro de planejamento de vida e não um investimento. “Há vários produtos na prateleira do banco, mas é um conceito diferente do investimento em si. Por isso, é preciso conhecer as regras para saber o quanto você quer ter de salário ou receber na sua aposentadoria”, afirma.
A pedido de VEJA, a especialista cita perguntas fundamentais que devem ser feitas pelo trabalhador antes de ir atrás do plano:
1) O que eu quero para o meu futuro?
Segundo Arlete, o trabalhador precisa pensar e planejar quando é que vai parar de trabalhar ou diminuir o ritmo de trabalho. Além disso, é preciso estimar qual padrão de vida desejará ter nesse período. Tendo isso com clareza fica mais fácil precificar o quanto precisará investir.
2) Qual é meu horizonte de tempo? Qual o momento de vida?
Quanto antes o trabalhador começar a se preocupar com a questão, mais tempo ele terá para construir sua reserva e menor será a necessidade de parar de consumir algo para guardar dinheiro para o futuro. Segundo a especialista, é necessário que o trabalhador pense se quer receber a renda até uma certa idade ou de forma vitalícia. “Se você acha que vai viver x anos, terá problemas se viver mais.”
3) A minha empresa oferece? Ela é patrocinadora?
Caso o cidadão trabalhe com carteira assinada, ele deve verificar se a empresa que ele trabalha oferece planos de previdência complementar. Os planos vinculados a empresas ou entidades de classe (como sindicatos) são chamados de previdência fechada. Segundo a especialista, nesse tipo de produto, a previdência é administrada por uma entidade autônoma sem fins lucrativos. “Toda a rentabilidade será do plano e isso se reverte em benefício futuro”, com isso, se torna uma boa opção.
4) E se eu sou empreendedor ou trabalho por conta?
Neste caso, a opção inicial são os planos de previdência aberta comercializados por bancos, corretoras e seguradoras. Quem quiser contratar um plano aberto precisa entender os custos de administração de cada plano. É preciso avaliar qual o custo de administração (quanto a instituição cobra para manter o fundo), taxa de carregamento (quanto custa para colocar o dinheiro) e rentabilidade. “Com essas informações, a pessoa tem condição de comparar e pode ir atrás daquele que se encaixar melhor em seu orçamento e momento de vida.” No caso da previdência aberta, além desses dados, é preciso entender a diferença entre os dois principais produtos, o PGBL (Plano Gerador de Benefício Livre) e o VGBL. No PGBL, é possível que sejam deduzidos da declaração anual do Imposto de Renda em até 12% da renda tributável. Porém, quando resgatar, pagará IR sobre todo o valor. Já no VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre), não há essa dedução. Esse plano não apresenta a vantagem na dedução. Entretanto, no resgate, o imposto incidirá apenas sobre os rendimentos, não sobre o total.
5) No que preciso investir para ter a minha reserva?
Arlete chama a atenção para que o trabalhador também pense em outros canais para conseguir acumular recursos para a aposentadoria. Ela cita investimento de renda fixa, fundo de investimento e até mercado de capitais (ações) – esse para quem tem perfil um pouco mais arrojado.
Mudanças na aposentadoria
A reforma da Previdência fixou uma idade mínima para a aposentadoria de 62 anos para mulheres e 65 anos para os homens. Para quem já está no mercado de trabalho, há cinco regras de transição para quem o trabalhador se aposente antes da idade fixada. Entretanto, as pessoas terão que trabalhar mais ou pedir o benefício quando forem um pouco mais velhas do que antes da reforma.
Outra mudança que mexe de forma importante com o planejamento da aposentadoria é o cálculo do benefício. Agora, a previdência pública considera a média de 100% dos salários de contribuição do trabalhador para o INSS. Antes da mudança, os 20% menores salários saiam da conta. Então, a média salarial tende a ficar menor. A conta para quando o trabalhador receberá efetivamente de aposentadoria também mudou: dessa média de 100% dos salários, o trabalhador receberá 60% se contribuiu pelo tempo mínimo (15 anos para mulheres e 20 para os homens) e mais 2% por ano que exceder a carência mínima. Essa é a única fórmula de cálculo do benefício. Antes, o trabalhador podia optar por fator previdenciário, regra por idade e o 86/96. Nas duas últimas, era mais fácil atingir os 100% da aposentadoria.
Para o economista Fábio Giambiagi, a reforma aprovada foi a possível, mas não isenta o país de passar novamente por mudanças na aposentadoria. Segundo ele, em 2023 ou, no mais tardar, 2027, o governo terá de encarar a discussão novamente. Segundo o especialista, a volta ao tema não se trata nem da inclusão da capitalização, sistema que usa princípios e meios da previdência complementar para o financiamento do benefício do segurado, mas de três temas que também não foram contemplados no texto final da PEC, que será promulgada: aposentadoria dos rurais, Benefício de Prestação Continuada (BPC) e diferença de regras previdenciárias entre os gêneros.
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