Sem esconder seu desconforto com as investigações em torno do Decreto dos Portos, em que é suspeito de haver beneficiado a concessionária Rodrimar, o presidente Michel Temer abriu nesta segunda-feira (13) à imprensa reunião de trabalho com ministros, técnicos e representantes do setor privado sobre o Decreto da Relicitação, que pode beneficiar concessionárias de rodovias, aeroportos e ferrovias com as contas desequilibradas.
“Muitas vezes verifico que decretos por mim assinados, que foram objetos dessas preliminares todas (reuniões registradas em ata), das quais tomo conhecimento apenas no dia, o que se alega é que o presidente da República quis beneficiar uma ou outra empresa”, comentou, ao abrir a reunião. “Isso gera procedimentos investigativos que alcançam cinco mil, seis mil páginas para revelar o óbvio, que se deu um processo para chegar ao Presidente da República”.
Ele explicou que pediu para que a reunião fosse transmitida pela TV para deixar clara a motivação do governo, caso a medida seja adotada. “Queremos mostrar fatos, e não um desejo ilícito, não transparente”.
O Decreto da Relicitação é aguardado pelo setor privado há um ano e dois meses. De tão prometido para breve e em seguida adiado, ele ganhou o apelido de “decreto da semana que vem”. E a história se repetiu: mesmo se dizendo “pré-convencido”, Temer disse que analisaria o texto ao longo dos próximos dias.
Segundo fontes, o objetivo da reunião foi testar a receptividade ao decreto pela opinião pública e também por órgãos como o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União (TCU). “A mim me parece uma péssima saída”, disse o procurador do Ministério Público junto ao TCU Júlio Marcelo de Oliveira. “Ela incentiva a irresponsabilidade das empresas no momento da licitação. Desmoraliza o modelo de concessões brasileiro”.
No extremo oposto, o presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), César Borges, que esteve na reunião com Temer, disse ao Estadoesperar que o decreto seja de fato assinado nos próximos dias.
A relicitação é o mecanismo que permite às concessionárias em infraestrutura devolver os empreendimentos ao governo para que sejam novamente leiloados. Até que passe para outro grupo privado, a antiga concessionária continua à frente do negócio, mas com um nível menor de exigências.
É uma alternativa tida como mais benéfica ao usuário do que o caminho tradicional, que é a caducidade. Nela, o governo federal retoma o negócio e tem a obrigação de administrá-lo, o que gera novas despesas num orçamento apertado.
Esse mecanismo foi criado por meio de uma Medida Provisória (MP) editada em novembro de 2016 e convertida na Lei 13.448 em junho de 2017. Desde então, aguarda um decreto para ser colocado em prática. A demora era explicada, nos bastidores, pelas investigações em torno do Decreto dos Portos.
Possibilidade. Já há duas candidatas ao processo: a Via 040, que opera um trecho de 936,8 km da BR-040 entre o Distrito Federal e Juiz de Fora (MG), e a Rodovia do Aço, que administra 200 km da BR-293 no Rio de Janeiro, desde a divisa com Minas Gerais até o entroncamento com a Via Dutra.
O vice-presidente de Rodovias da Invepar, que controla a Via 040, Túlio Abi-saber, disse que “situações imprevisíveis” geraram os desequilíbrios nas concessões de rodovias e que a relicitação é uma “saída benéfica para o Estado brasileiro e para o usuário”, pois possibilita uma devolução amigável de forma célere. A Acciona, que detém a concessão da Rodovia do Aço, informou que protocolou seu pedido de relicitação no dia 11 de abril. “A equação, considerando as atuais tarifas e os custos de manutenção e investimento, tornou-se inviável, obrigando a Acciona a tomar a decisão de entregar a concessão”.
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