Evandro Ferrari: “O foco é no resultado”
Compartilhe

O diretor da GRAN Cargo e do SETCESP, contou à revista como tem enfrentado os desafios do cenário político e econômico. Falou sobre a recente alta do IOF e o tarifaço americano, explicando como as mudanças refletem na gestão de sua empresa e no setor

Como foi o início da sua carreira no transporte. Quando e por que decidiu empreender no setor?

Estou no transporte desde 1995. Nesses 30 anos, 15 foram como funcionário e, depois desse tempo e experiência, surgiu a oportunidade de abrir minha própria empresa. Com um sócio, decidi montar a GRAN Cargo Transportes em meados de 2010. Iniciamos uma trajetória do zero.

Como estratégia de negócio, decidimos operar nos segmentos onde outras empresas não faziam muito questão. Entregas críticas e complexas, em hipermercados e home centers. Começamos por um nicho que era deficitário no mercado e aos poucos fomos construindo uma história que completa 15 anos da GRAN Cargo.

Atuamos com cargas fracionadas nas regiões do Centro-Oeste, Norte e também no Triângulo Mineiro. Além dessas operações de destino, temos origens diferentes com unidades estabelecidas em Blumenau, São José dos Campos, Curitiba, Pouso Alegre e Campinas.

Teve um momento em que participou ativamente da COMJOVEM SP. Que recordações tem desta época?

Ingressei no SETCESP em 2004, já com a intenção de participar da COMJOVEM São Paulo. Tenho recordações maravilhosas da época, a comissão foi um berço de crescimento e alavancagem de conhecimento. Fiz muitas amizades que permaneceram. Uma delas é a do presidente Marcelo. Não saberia mensurar tantas visitas técnicas e viagens que a gente fez. Todas elas trouxeram uma grande bagagem e foram muito enriquecedoras. E as relações criadas através da COMJOVEM com grandes fornecedores, carrego comigo até hoje. Fui vice-coordenador da comissão por duas gestões, a primeira com Tibério Ramos e a segunda com o Roberto Mira Júnior.

Como é estar hoje à frente da diretoria financeira do SETCESP? Quais experiências profissionais contribuem para sua atuação na entidade?

Coordeno a área junto com o gerente financeiro da entidade. Procuro trazer as experiências e os métodos que utilizo na minha empresa, mas conto com a ajuda dele, porque está há muito mais tempo do que eu e conhece melhor as rotinas do SETCESP. É uma troca de experiências.

Sempre frequentei a entidade como um associado, só que quando você passa para um lado que você tem que tomar decisões, é diferente. Acho que antes de implementar mudanças, preciso entender como a entidade funciona internamente.

Sei que tem muita coisa que pode ser profissionalizada ou melhorada, mas é uma mudança gradual. O raciocínio financeiro, a receita e as obrigações são diferentes de uma empresa. Como é uma gestão nova, um presidente novo, um conselho novo, as transformações acabam sendo aos poucos.

 “Os cursos contam com professores de altíssimo nível, isso fez com que a GRAN Cargo crescesse também através do SETCESP”

Quais vantagens as empresas têm de estar inseridas em uma entidade de classe?

Sou suspeito para falar, desde que frequento aqui só consigo ver os pontos positivos que a entidade traz como: acesso a fornecedores, treinamentos, posicionamento com os órgãos públicos e as melhores práticas. Particularmente, na minha empresa faço questão que os colaboradores realizem os treinamentos do SETCESP, porque é uma forma de enriquecer o conhecimento e aperfeiçoar os profissionais. Isso cria um vínculo muito forte entre a empresa e a entidade e entre a empresa e o colaborador.

Na entidade, os cursos contam com professores de altíssimo nível, isso fez com que a GRAN Cargo crescesse também através do SETCESP.

Na sua opinião, como o tarifaço do governo americano impactará o transporte rodoviário de cargas e a logística no Brasil?

O transporte é a espinha dorsal do mercado porque movimenta todo o PIB do País. E cerca de 65% da carga movimentada é via transporte rodoviário.

Muitos dos produtos taxados são perecíveis: frutas, pescados, carne. Até se desenhar novos mercados, as empresas que deixaram de exportar esses produtos vão precisar de menos insumos, menos pessoal e, com certeza, menos transporte.

Se transporto menos, naturalmente também vou precisar de menos pessoas e equipamentos. Isso gerará um arrefecimento na economia. Caso não seja possível equalizar, teremos uma retração de mercado muito significativa. Por enquanto, o impacto da taxação no meu segmento ainda não foi sentido.

Quais foram os efeitos do aumento do IOF nas decisões financeiras das empresas de transporte, especialmente nas operações de crédito e câmbio?

A alta do IOF, especificamente para a GRAN Cargo, foi crítica porque estamos iniciando a construção da nossa matriz e precisamos captar recursos. Há três meses analisamos essa captação e prevíamos um cenário do IOF em 3,38. Agora foi para 3,50. Essa mudança fez com que ainda não definíssemos qual a melhor estratégia de aquisição de recursos.

Precisamos realizar uma tomada de crédito bastante significativa, e isso exige cautela nas escolhas. Podemos, por exemplo, optar por captar recursos lastreados em euro, mas existe o risco de mudanças repentinas, como uma nova queda do IOF. Assim, uma decisão que parece boa hoje, pode não ser a melhor amanhã. A falta de previsibilidade financeira dificulta o planejamento, o mais complicado é que não posso esperar pelo momento certo, porque preciso construir o mais rápido possível.

Se o cenário fosse mais previsível e não houvesse o aumento da alíquota, como estariam as coisas?

No meu ponto de vista, não é o IOF que é o maior inibidor do crescimento econômico e sim a Selic a 15%. Mas dependendo da necessidade de investimento essa dificuldade toma uma proporção maior.

Entendo que a ideia do governo de subir Selic é justamente para frear a inflação, estamos longe da meta, mas ela já começou a dar sinais de que está perdendo força, significando que as medidas tomadas surtiram efeito. Só que esse movimento para o mercado de transporte pode ser negativo. Temos que sempre lembrar que estamos no Brasil, aqui nem toda decisão é lógica e não temos previsibilidade, principalmente, no que diz respeito ao cenário político.

Não paramos de comprar equipamentos e insumos necessários a nossa operação em nenhum mês, então, não será o IOF que vai nos segurar.

Como o setor de transporte rodoviário de cargas tem recebido e implementado novas tecnologias de inteligência artificial e automação?

Quando se fala de tecnologia, inovação e desenvolvimento, comparo o agora a como era minha empresa há dois anos. A transformação é visível. Hoje, a empresa tem indicadores e painéis de controle que projetam todos os cenários possíveis e imaginários. São indicadores de operação, financeiro, de atendimento, de pós-venda de gestão de parceiros. O BI [do inglês Business Intelligence] se tornou uma ferramenta indispensável no meu negócio de transporte e acredito que em muitas organizações do setor também.

A tendência é realmente a IA nosauxiliar na gestão, desde coisas simples as mais elaboradas. Por exemplo, se o SAC tem que fazer uma resposta para um cliente com um pouco mais de delicadeza, o pessoal já tem a orientação de buscar essa resposta em uma IA que formule este retorno em um tom mais elegante, técnico e formal.  Isso é só um dos exemplos que fazem parte do nosso cotidiano.

“Temos que sempre lembrar que estamos no Brasil, aqui nem toda decisão é lógica e não temos previsibilidade”

Como sua empresa vem lidando com o desafio da escassez de mão de obra? Existe alguma ação específica que você, como empresário, acredita ser essencial para driblar esta questão?

Estive em um fórum de tarifas da NTC&Logística e lembro que foi apresentado uma pesquisa de mercado que revelava que 93% das empresas tinham problema com contratação de motorista. Na GRAN Cargo posso afirmar que nós não temos essa dificuldade.

Acredito que isso ocorra por conta da relação que a gente tem com os colaboradores, inclusive, com os motoristas. Também oferecemos uma remuneração diferenciada acima da média de mercado. A renovação de frota é constante, nossos equipamentos são novos e modernos. Como motorista, me sentiria muito melhor dirigindo um caminhão de última geração.

Acima destes pontos, o principal de tudo é o respeito na nossa relação empresa e empregado. Existe uma comunicação muito aberta e franca com nossos colaboradores. Todos eles têm metas a cumprir e são remunerados à altura do que exigimos. Isso faz com que a gente tenha uma relação firme, e esses motoristas que estão felizes em trabalhar lá, trazem outros motoristas.

“As empresas que não estão aqui perdem muito”

Quais são os desafios de ser um empresário transportador?

O transporte precisa evoluir muito no quesito qualificação. Quanto mais qualificado é o empresário e mais qualificada for a sua equipe, mais fácil fica a gestão da empresa.

O empresário precisa ter muita resiliência e determinação. Não pode considerar que o aumento de tarifas ou de impostos será uma barreira intransponível. Às vezes a gente se preocupa demais com o quadro político e econômico. Se o imposto aumentar, você repassará isso para o frete e, infelizmente, quem vai pagar é o consumidor final. Desafios vão sempre surgir e nessas horas a saída é levantar a cabeça e ir trabalhar.

Em janeiro de 2026 o SETCESP completará 90 anos. O que a entidade deve fazer para continuar atualizada e relevante para o setor?

A renovação de diretoria é essencial para qualquer entidade e o SETCESP já segue esse modelo de gestão. Aqui, você não vê o diretor se perpetuando por 10 ou 15 anos. A renovação é o segredo para a gente conseguir atingir mais 90 anos. Fora isso, é importante manter-se próxima dos órgãos públicos, políticos e das outras entidades.

Outro ponto positivo da entidade é a diversificação de serviços. É uma pena que no universo de empresas que o SETCESP representa, apenas uma parcela seja associada. As empresas que não estão aqui perdem muito.

Qual recado poderia deixar para os nossos leitores?

Primeiro, é que tenha coragem para enfrentar as adversidades em um cenário globalizado. Hoje, uma decisão do presidente dos Estados Unidos, afeta o seu negócio. Entenda quais são as decisões que estão sendo tomadas no âmbito político, porque essas decisões podem te impactar. Mais do que tudo, foque em resultados.

Vejo que muitos empresários não têm coragem de cobrar o que deveria pelo serviço prestado, com receio de perder um cliente para um concorrente, quando o foco deveria ser a qualidade do serviço, performance e resultado.

Entendo que no começo você quer faturar, porque está se estruturando, se encaixando no mercado, mas não dá para aceitar qualquer preço. Você não pode crescer, contraindo dívidas sem ter a certeza de que sua remuneração está adequada. Então, o foco é no resultado.


voltar