Desonerar folha ajuda a combater efeito do câmbio, diz professor da FGV
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22 de Novembro de 2010 – 10h00 horas / Valor Econômico
Preocupado com a forte valorização do real, o economista Aloisio Araújo, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), defende a desoneração da folha salarial como arma decisiva para melhorar a competitividade das empresas. Companhias exportadoras ou expostas à concorrência dos importados no mercado interno com elevado custo de mão de obra são duplamente punidas no momento, sofrendo com o real apreciado e os pesados impostos que incidem sobre a folha de pagamentos no Brasil, diz Araújo. Aliviar a carga de tributos sobre a mão de obra, segundo ele, é uma das maneiras de enfrentar o desafio.
“A minha preocupação é que, num momento como este, o país faça opções erradas para combater o problema do câmbio, dando subsídios ou elevando tarifas de importação. Seria um retrocesso“, afirma Araújo, para quem também é importante que o Brasil atue em outras frentes para tratar da questão do real forte, como trabalhar na redução dos juros reais, o que vai exigir um aperto fiscal expressivo.
Araújo diz que o câmbio valorizado pode causar uma “primarização“ exagerada da economia brasileira, levando a uma ênfase excessiva na produção de commodities. Segundo ele, dada a descoberta das reservas de petróleo na camada pré-sal, já é inevitável algum movimento nessa direção nos próximos anos. Com o dólar muito barato, esse processo pode se acentuar de modo indesejado.
“A questão do câmbio é grave“, diz Araújo, emitindo uma opinião rara para um economista ortodoxo. A combinação de valorização dos preços de commodities, política monetária expansionista nos EUA e controle do câmbio na China torna complicada a situação do real, num cenário em que os juros brasileiros são os mais altos do mundo.
Como o Brasil tributa muito mais a folha de salários do que os seus concorrentes, é hora de o país enfrentar a questão e diminuir os encargos com a mão de obra, defende Araújo. Para ele, reduzir a contribuição previdenciária e os encargos do chamado “sistema S“ (como as contribuições para o Senai e o Sesc ) são caminhos que podem ser seguidos.
Segundo Araújo, a perda de receita previdenciária pode ser em parte compensada com o aumento da formalização que tende a ser provocada pela desoneração da folha salarial, assim como por medidas que diminuam os gastos com benefícios da Previdência, como um eventual aumento da idade mínima para a aposentadoria.
Outra possibilidade é compensar a receita mais baixa com um aumento de impostos que imponham menos distorções à economia do que os tributos sobre a folha de pagamentos, diz. É o caso de uma nova CPMF, mas desde que com uma alíquota menor que o 0,38% cobrado anteriormente. “Na média, porém, é fundamental não aumentar a carga tributária“, afirma ele, observando que o melhor a fazer é cortar outros gastos correntes.
Araújo diz temer que, no calor do momento, o país opte por subsídios a setores específicos ou por aumento das tarifas de importação. “Isso introduziria distorções na economia brasileira, que podem até causar problemas com a OMC [Organização Mundial do Comércio]. Tenho medo que a situação acabe justificando a adoção de medidas muito ruins.“
Araújo também vê como imperativo mudar a orientação das contas públicas, adotando uma política fiscal mais rígida, a melhor estratégia para conseguir derrubar os juros de modo consistente. Segundo ele, o país precisa insistir na redução dos juros reais (descontada a inflação), processo que vem ocorrendo ao longo dos últimos 15 anos, mas que não levou a taxa a um nível mais desejável. Hoje, a taxa real está próxima de 6%. Um nível mais razoável seria algo na casa de 2% a 3%.
Um ajuste fiscal mais forte no começo do mandato da presidente eleita, Dilma Rousseff (PT), seria um passo importante para caminhar nessa direção, a exemplo do que fez Luiz Inácio Lula da Silva no começo de seu primeiro mandato, acredita Araújo. Ele lembra que, em 2003, a elevação do superávit primário, combinada à determinação de respeitar os contratos, foi crucial para derrubar os juros. Como as taxas nos países desenvolvidos devem ficar baixos por muito tempo, o Brasil tem que diminuir os juros internos para evitar a avalanche de capital externo que contribui para agravar a valorizar o câmbio.
O ortodoxo Araújo não acha um pecado a adoção de medidas de controle de capitais, como a elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre as aplicações de renda fixa, mas diz que não se deve ter ilusões quanto ao seu impacto sobre a trajetória do câmbio. “É um instrumento que pode ser usado num momento mais crítico, mas é apenas um paliativo. A solução não virá daí“, afirma ele, também professor do Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa).
Além da desoneração da folha salarial e do esforço para reduzir os juros por meio do ajuste fiscal, Araújo acredita que o governo deve buscar medidas que aumentem a eficiência econômica do país. Um empenho por aprovar medidas de reforma no sistema tributário, com a simplificação da legislação de impostos, é um exemplo citado por ele, assim como alguma mudança na legislação trabalhista.
“O governo pode aproveitar a grande maioria que terá no Congresso“, diz ele, também lembrando o que fez Lula no começo do seu primeiro mandato, quando foram aprovadas reformas como a lei de falências e as medidas que ajudaram a impulsionar o crédito imobiliário no país. “O novo governo pode copiar um pouco o que foi feito no primeiro governo Lula.“ Araújo também acha importante que se enfrente a questão do déficit da Previdência do setor público, muito mais grave que o do setor privado.

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