Carga blindada
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13 de Novembro de 2008 – 10h00 horas / Quatro Rodas Frota S/A
Os veículos blindados foram utilizados pela primeira vez em larga escala durante a Primeira Guerra Mundial. Com o tempo, a tecnologia deixou de ser exclusividade dos campos de batalha e passou a fazer parte do cotidiano dos grandes centros urbanos de países com altos índices de violência em especial, na África e na América Latina , seja para proteger carros-fortes, seja para dar segurança a usuários de automóveis mais endinheirados. Mais recente ainda é o emprego dessa tecnologia em caminhões. No Brasil, esse mercado ainda é incipiente, tanto que a maior encomenda já feita a uma empresa nacional foi de um cliente estrangeiro, o governo da Nigéria. As poucas blindadoras brasileiras que atuam nesse segmento se dizem preparadas para ampliar o atendimento basta haver demanda. O problema é o custo: o serviço sai de 60 000 a 200 000 reais. O preço varia de acordo com a área protegida (se apenas a cabine ou a cabine e o baú), o modelo e o tamanho do caminhão.
A falta de segurança nas rodovias brasileiras, no entanto, faz da blindagem de caminhões um mercado promissor no país. Segundo a Associação Nacional de Transporte de Cargas e Logística (NTC), são registradas mais de 11 000 ocorrências de roubo de carga por ano no Brasil 80% delas na região Sudeste. Em 2006, último ano com dados consolidados, elas causaram um prejuízo de 710 milhões de reais.
A TecnoBlindagem, uma empresa de Cotia, na região metropolitana de São Paulo, afirma ter sido a pioneira nacional em blindagem de cabine de caminhão, cinco anos atrás. “Até então ninguém havia feito isso”, diz o gerente, Demetrius Washington. Os donos da TecnoBlindagem têm também uma empresa de recuperação de caminhões e foi por meio dela que recebeu a primeira encomenda, de uma transportadora. Como nunca havia blindado um caminhão antes, a TecnoBlindagem resolveu fazer um experimento com a cabine de um veículo próprio, usado para transporte de carros. Deu certo e a blindadora pôde, então, aceitar encomenda: a proteção de outras cinco cabines de caminhão. O nome do cliente é mantido em sigilo, por compromisso contratual. Washington informa apenas que era uma transportadora que trabalhava com variados tipos de carga de alto valor agregado, como produtos farmacêuticos e eletroeletrônicos.
O principal objetivo da blindagem era proteger o motorista e garantir que ele pudesse atravessar, sem parar, eventuais bloqueios montados por assaltantes. Concluída com sucesso a primeira encomenda, a blindadora entrou em contato com grandes transportadoras para oferecer o novo serviço, mas não obteve retorno. “A maior preocupação dos empresários é que haja um impacto muito grande no preço do frete”, diz Washington. “De toda forma, estamos prontos para atender a novas encomendas.”
BLINDAGEM COMPLETA Quando o assunto parecia ter esfriado, outra blindadora decidiu entrar nesse mercado, oferecendo a proteção não apenas na cabine, mas também no baú. Depois de blindar seis cabines de caminhão de duas distribuidoras brasileiras, a Auto Life, de Cajamar, também na região metropolitana de São Paulo, realizou a blindagem completa de um caminhão para a transportadora de valores TransVip, que atua nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro.
Em seguida, fechou um contrato com o governo da Nigéria para blindar, também inteiros, outros dez caminhões Mercedes-Benz 1620, destinados ao transporte de ouro e diamante no país africano. A motivação da TransVip foi a necessidade de utilizar um veículo com capacidade de carga maior que a dos tradicionais carros-fortes para transportar moedas. “Ficamos satisfeitos com o resultado, pois alcançamos nosso objetivo: transportar um volume maior de carga, respeitando a legislação e protegendo o motorista”, afirma Elton Vieira, superintendente da transportadora. Por enquanto, esse é o único caminhão blindado da TransVip, que conta com um total de 80 carros-fortes.
ALTA RESISTÊNCIA Os caminhões do governo nigeriano foram blindados na categoria 3, um nível acima na escala de segurança em relação o que costuma ser feito no Brasil, tanto em carros de passeio quanto em carros-fortes e, agora, em caminhões. A blindagem de categoria 3 suporta ataques de fuzis AR-15, AK-47 e FAL algumas dessas armas são de uso exclusivo do Exército, mas acabam nas mãos de bandidos também.
As blindagens de caminhão feitas para clientes brasileiros estão na categoria 3A e podem deter no máximo projéteis de 44 Magnum e 9 mm Luger. De acordo com Marcelo Souza, gerente comercial da Auto Life, essa diferença se justifica porque os assaltos aqui são feitos em geral com armas de mão, enquanto na Nigéria prevalece o armamento pesado. No Brasil, a blindagem da categoria 3 precisa de autorização especial da Divisão de Produtos Controlados do Ministério do Exército.
Os caminhões blindados da Auto Life foram apresentados durante o 16º Salão Internacional do Transporte (Fenatran), realizado em São Paulo em outubro do ano passado. Cada blindagem custou ao governo nigeriano 45 000 dólares. O Mercedes-Benz 1620, modelo vendido no Brasil, foi escolhido pelo cliente pelo fato de o fabricante manter uma ampla rede de assistência técnica na Nigéria.
Segundo Souza, a blindagem pode ser usada como argumento para a redução do valor do seguro da carga, além de possibilitar a dispensa da escolta. Por outro lado, segundo o coordenador técnico da NTC, Neuto Gonçalves dos Reis, a blindagem pesa tanto no custo fixo (depreciação, licenciamento e o seguro do próprio caminhão, entre outros) quanto no custo variável (combustível, manutenção etc.) por quilômetro percorrido.
A blindagem também pode aumentar o peso do caminhão em 1,5 a 3 toneladas, além de reduzir o espaço disponível para carga em até 30%. Washington, da TecnoBlindagem, reconhece que o investimento só se paga com o uso do caminhão, já que é pouco provável que o proprietário do veículo recupere esse valor numa futura revenda. Ou seja, se ele gastar 80 000 reais para blindar um caminhão, dificilmente vai conseguir acrescentar esse valor na hora de revender o veículo. “Uma blindagem pode se desvalorizar até 100% em dois anos, mas a proteção perdura por tempo indeterminado”, diz Washington. Além da blindagem, é recomendável que o motorista receba treinamento em direção defensiva e evasiva.
MUITA MATEMÁTICA Tudo isso pode levar a uma difícil conta de custo/benefício para as transportadoras interessadas. Cada caso deve ser estudado detalhadamente, diz Reis, da NTC. Além das empresas especializadas em valores, transportadoras de cargas muito visadas são também um público-alvo importante para as blindadoras de caminhão. Em 2007, segundo pesquisa publicada pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Carga de São Paulo e Região (Setcesp), os campeões em roubo e furto no estado foram eletroeletrônicos (18,8%), carga fracionada (14%), produtos farmacêuticos (10,6%) e alimentícios (10%).
O segmento da blindagem de caminhões paga ou melhor, cobra caro por ser incipiente, como é comum acontecer em novos nichos de mercado. O preço da proteção, afirmam as blindadoras, tende a cair com o aumento da demanda. “Infelizmente, no momento, a vida do motorista tem ficado em segundo plano”, diz Washington, da TecnoBlindagem. De acordo com um levantamento da NTC, 204 motoristas e ajudantes foram mortos em assaltos a caminhão no Brasil entre os anos de1998 e 2006.

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