
Por: Thiago Fagotti
O retrato atual das rodovias brasileiras
Diariamente, ocorrem 87 acidentes envolvendo veículos de carga nas rodovias federais brasileiras. Em 2024, foram registradas 31.232 ocorrências pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), representando um aumento de 7,5% em relação ao ano anterior. Mais que números, esses dados revelam padrões fundamentais para entendermos os desafios da segurança viária no setor.
A concentração geográfica dos acidentes chama a atenção: as rodovias BR-101 e BR-116 respondem por quase 30% do total de ocorrências. Essa concentração não é coincidência, pois elas são as principais artérias do transporte nacional.
No total, 54.982 veículos de carga estiveram envolvidos em acidentes nas rodovias federais durante 2024. A análise detalhada revela que semirreboques e caminhões-trator, juntos, correspondem a cerca de 50% desses veículos acidentados.
Anatomia dos acidentes: causas e consequências
A análise das causas revela um padrão preocupante: a falta de atenção do condutor domina as estatísticas e tem crescido aceleradamente entre 2023 e 2024, superando o aumento geral de acidentes. Embora a base de dados não permita distinguir o motivo exato da desatenção – se uso de celular, fadiga, distração externa –, esse crescimento ressalta a urgência de campanhas focadas na atenção plena ao dirigir.

Quando observamos os tipos de acidentes, a colisão traseira representa quase 1 em cada 4 acidentes envolvendo veículos de carga. Contudo, é a colisão frontal que mais preocupa pela sua letalidade: em 2024, a taxa de mortalidade para ocupantes de veículos de carga em colisões frontais atingiu 7%. Ao expandirmos para todas as vítimas envolvidas em acidentes deste tipo com veículos de carga, o número se torna ainda mais alarmante: 14,8%.

Quando a estrada se torna mais perigosa
A análise temporal revela um paradoxo interessante: o maior volume de acidentes ocorre durante o dia, especialmente nos períodos da manhã e tarde, devido ao maior fluxo de veículos. Porém, é durante a madrugada que os acidentes se tornam mais letais, com pico especialmente pronunciado nas madrugadas de sábado, onde a taxa de mortalidade dos acidentes chega a 9,51%.
Essa alta letalidade na madrugada pode estar associada à combinação de fatores como fadiga do condutor, visibilidade reduzida, monotonia das longas viagens e consequente falta de atenção. Esses dados sublinham a importância de estratégias específicas para diferentes períodos e condições de operação.
Acidentes
Dia da semana |
Manhã |
Tarde |
Noite |
Madrugada |
segunda-feira |
1454 |
1508 |
938 |
516 |
terça-feira |
1437 |
1527 |
1000 |
462 |
quarta-feira |
1393 |
1534 |
1022 |
504 |
quinta-feira |
1399 |
1492 |
1054 |
517 |
sexta-feira |
1447 |
1738 |
1372 |
572 |
sábado |
1262 |
1269 |
1135 |
715 |
domingo |
819 |
1236 |
1265 |
645 |
Taxa de mortalidade
Dia da semana |
Manhã |
Tarde |
Noite |
Madrugada |
segunda-feira |
3,1% |
3,4% |
5,4% |
5,9% |
terça-feira |
3,8% |
3,2% |
5,1% |
5,4% |
quarta-feira |
3,2% |
3,3% |
5,1% |
7,0% |
quinta-feira |
3,2% |
3,6% |
6,2% |
6,3% |
sexta-feira |
3,6% |
3,5% |
5,4% |
6,0% |
sábado |
3,5% |
3,5% |
6,6% |
9,5% |
domingo |
4,2% |
3,8% |
7,2% |
5,7% |
A proteção desigual para ocupantes: veículos de cargas versus outros veículos
Um dos pontos mais significativos da análise revela uma diferença notável no impacto dos acidentes. Enquanto a maior parte dos ocupantes de veículos de carga sai ileso, as vítimas em outros tipos de veículos não compartilham da mesma proteção, com a maioria sofrendo lesões leves ou graves. A taxa de mortalidade mais que triplica para quem está em outros veículos: 2,28% para ocupantes de veículos de carga, versus 7,4% para ocupantes de outros tipos de veículos.
Esse dado reforça que a segurança na via é um dever de todos, com foco especial na proteção de todos os usuários da rodovia. O aumento de 10% nas vítimas fatais entre 2023 e 2024 (de 3.437 para 3.782) sublinha essa necessidade.

Estratégias de prevenção
A prevenção eficaz combina múltiplas frentes de ação. A manutenção preventiva regular evita falhas mecânicas críticas, enquanto o treinamento contínuo mantém motoristas atualizados em práticas de direção defensiva. O planejamento adequado de viagem, antecipando rotas e paradas para descanso, e a adaptação constante às condições de tráfego e clima são fundamentais. O respeito rigoroso aos limites de velocidade e sinalização, junto com períodos adequados de descanso, formam a base de um transporte mais seguro.
Os dados de 2024 confirmam que a segurança no transporte de cargas é um desafio complexo, mas não intransponível. A predominância da desatenção como causa, a letalidade das colisões frontais, a vulnerabilidade específica de condutores mais experientes e os padrões temporais de risco oferecem direções claras para ações preventivas.
O setor de transporte, com sua posição estratégica na economia nacional, tem a oportunidade de liderar transformações positivas. Investimentos em tecnologia, treinamento focado nos riscos identificados e campanhas de conscientização são passos fundamentais. Mais que uma meta operacional, a segurança representa um compromisso ético que protege vidas e impulsiona o bem-estar de toda a sociedade.
Com participação ativa de todos os envolvidos: empresas, condutores e entidades do setor –, podemos construir rodovias mais seguras, onde a experiência do transporte de cargas brasileiro se traduza em resultados cada vez melhores para todos.
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