Deflação pressiona o BC a cortar os juros na semana que vem
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Retração de 0,38% do IPCA em maio – a segunda consecutiva – mostra a economia paralisada e realimenta a expectativa de que Banco Central vai reduzir novamente a taxa Selic, na tentativa de reanimar a atividade. Decisão sai na próxima semana

Desde 1998, o Brasil não registrava dois meses consecutivos de queda do nível geral de preços. Mas, com a pandemia do novo coronavírus, isso tornou-se uma realidade novamente. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou ontem que a inflação, que já havia caído 0,31% em abril, caiu mais 0,38% em maio deste ano. A deflação foi a maior para o mês de maio em 22 anos, e renovou as expectativas do mercado financeiro de que o Banco Central (BC) promoverá um novo corte da taxa básica de juros (Selic), na próxima semana, na tentativa de reanimar a economia.

A queda do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de maio é reflexo direto da recessão econômica provocada pela pandemia do novo coronavírus. A emergência sanitária impôs o fechamento do comércio e reduziu a renda de milhões de brasileiros, diminuindo a oferta dos bens e serviços não essenciais e também a demanda da população por esses produtos. Essa conjunção de fatores derrubou os preços de quase todos os itens da cesta de inflação do consumidor brasileiro. Segundo o IBGE, cinco dos nove grupos de produtos avaliados pelo IPCA tiveram deflação em maio. Até os preços dos alimentos, que estão em alta desde o início da pandemia, desaceleraram no mês passado.

O principal impacto negativo veio dos transportes, que registrou deflação de 1,9% por conta da queda de preços da gasolina (4,35%), do etanol (5,96%), do óleo diesel (6,44%) e das passagens aéreas (27,15%). Mas as despesas com habitação também exerceram uma influência relevante. O grupo registrou deflação de 0,25% depois que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) decidiu manter a bandeira tarifária verde até o fim deste ano, reduzindo em 0,58% o impacto da tarifa da energia elétrica no IPCA.

Por outro lado, o grupo de alimentação e bebidas passou a exercer pressão menor na inflação. Depois da disparada de preços registrada no início da pandemia, quando as pessoas correram aos supermercados para abastecer a despensa, os preços dos alimentos começaram a se acomodar. Em maio, o grupo registrou inflação de apenas 0,24%, ante 1,79% em abril. Além disso, alguns produtos ficaram mais baratos com a melhora das condições climáticas, como a cenoura (-14,95%) e as frutas (-2,10%).

Selic

De acordo com o IBGE, a inflação acumula alta de 1,88% dos últimos 12 meses. O resultado é bem menor que os 2,40% observados nos 12 meses imediatamente anteriores e deixa a inflação ainda mais longe da meta estipulada para a inflação deste ano pelo Banco Central.

A meta do governo é de inflação de 4%, com um intervalo de tolerância entre 2,5% e 5,5%. No entanto, devido à crise econômica, o cenário de baixa demanda não vai acabar junto com a quarentena. Por isso, mesmo que a inflação volte para o campo positivo nos próximos meses, o IPCA deve ficar abaixo do piso da meta do BC. O Boletim Focus desta semana, por exemplo, projeta uma inflação de apenas 1,53% em 2020. E corretoras como a XP dizem que esse índice ainda pode ser menor do que 1%.

Desse modo, a deflação de maio só reforçou as expectativas do mercado financeiro por um novo corte da taxa básica de juros. O entendimento ainda ganhou força, ontem, com a decisão do Federal Reserve (Fed) de manter os juros dos Estados Unidos entre 0 e 0,25% ao ano. Por aqui, a expectativa é de que o BC faça mais um corte de 0,75 pontos na Selic já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), marcada para a próxima semana. Se confirmado, esse corte vai derrubar a taxa dos atuais 3% para a nova mínima histórica de 2,25% ao ano.

“Inflação baixa é sinônimo de atividade econômica fraca. E a política monetária está aí para reativar isso. Por isso, o BC deve cortar os juros para estimular a demanda e diminuir o buraco do PIB (Produto Interno Bruto)”, afirmou o gerente de IPCA da Fundação Getulio Vargas, André Braz, lembrando que, além de reduzir a inflação, a pandemia do coronavírus deve provocar um baque de pelo menos 6% no PIB do Brasil neste ano. “Esses dados reforçam o corte de juros. E o mercado converge para um corte de 0,75 pontos porque as condições econômicas permitem isso”, completou o estrategista-chefe do banco digital Modalmais, Felipe Sichel.

 

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