O plano, apresentado neste mês em seminário aberto, prevê a criação de uma rede de vias navegáveis, formadas pelos rios Pinheiros, Tietê e as represas Billings e Taiaçupeba, que seriam interligadas com a construção de um canal navegável de 17 quilômetros. O professor da FAU e coordenador do grupo responsável pelo projeto, Alexandre Delijaicov, estima o custo da empreitada em cerca de R$ 3 bilhões, investidos ao longo de até 30 anos. Só para comparação, o trecho sul do Rodoanel foi orçado em R$ 3,6 bilhões.
A principal função do hidroanel seria transporte de lixo e outros resíduos urbanos, como entulho da construção civil, sedimento de dragagens, terra de escavações e lodo das estações de tratamento de água e esgoto. Toda essa carga seria encaminhada a três portos de destino, em Itaquaquecetuba, Carapicuíba e no dique da Billings da rodovia Anchieta, em São Bernardo do Campo. Eles ganharam o nome de triportos – o “tri“ vem de trimodal, por conta da integração prevista, nesses pontos, com o Rodoanel e o futuro Ferroanel.
Cada um desses pontos abrigará plantas industriais para triagem e tratamento do lixo e resíduos – espécie de “montadoras ao contrário“ na definição de Delijaicov. O material plástico, por exemplo, seria separado, picado, moído e encaminhado a indústrias como matéria-prima. No caso de resíduos da construção civil, o destino seria, após a trituração, a produção de argamassa, concreto e material para pavimentação de ruas.
O material orgânico, como o lodo, também teria tratamento próprio. São três destinações: compactação para uso em blocos de pavimentação; transformação em adubo para parques da região metropolitana; e alimentação do biodigestor, equipamento para geração do biogás utilizado para funcionamento das máquinas do porto.
O projeto prevê a construção de outros 74 portos para o embarque do lixo e resíduos. Sessenta deles, batizados de ecoportos, receberiam o material já triado, enviado por caminhões de lixo reciclados ou moradores das redondezas.
“O sistema tem como meta acabar em até 30 anos com os aterros sanitários e lixões da região metropolitana, já em vias de exaustão“, afirma. Mas não só lixo ocupariam as embarcações. O plano prevê também transporte de passageiros – moradores e turistas – e carga comercial, como hortifrutigranjeiros e material de construção civil. Em relação à última categoria, está nos planos a construção de 17 cais para embarque da produção de usinas de concreto. O exemplo vem de Paris, em que grande parte dos insumos da construção navega pelas águas do rio Sena – entre, eles a produção de concreteiras instaladas às suas margens.
Os arquitetos e urbanistas da FAU também projetaram parques ao longo do hidroanel. Três deles ficariam em torno de lagos com construção prevista, na Penha, em São Miguel Paulista e Itaquaquecetuba, como instrumento de vazão às cheias do Tietê e combate enchentes.
Defensores do hidroanel citam outras duas vantagens do sistema: combate aos congestionamentos e à poluição na Grande São Paulo. Os benefícios viriam da redução na quantidade de caminhões, responsáveis por cerca de 440 mil viagens por dia na região metropolitana. Só a movimentação de cargas da construção civil responde por 26.000 viagens diárias.
“Com o hidroanel, a estimada queda de pelo menos 10% nas viagens e no volume de cargas traria impacto significativo para a qualidade do ar e do trânsito“, diz Frederico Bussinger, ex-diretor do Departamento Hidroviário da Secretaria Estadual de Logística e Transporte, responsável, durante sua gestão, pela contratação em 2009 do estudo de pré-viabilidade técnica, econômica e ambiental agora finalizado.
Ainda na sua avaliação, o hidroanel será necessário para que São Paulo cumpra a meta, prevista em lei estadual, de reduzir até 2020 as emissões de gás carbônico em 20% em relação aos níveis de 2005. “No mundo, os transportes respondem por 23% das emissões de gases de efeito estufa. No Brasil são 42% e em São Paulo, 55%. Por isso, no Brasil e, com mais razão, em São Paulo, o setor de transportes e prioridade AAA para que possa atingir a meta“, argumenta.
Opinião parecida tem Renato Viégas, diretor-presidente da Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano (Emplasa), vinculada à Secretaria Estadual de Desenvolvimento Metropolitano. “O transporte rodoviário emite seis vezes mais poluentes que o hidroviário“, afirma, em defesa da rede de hidrovias.
O projeto ainda tem pela frente pelo menos quatro etapas: estudo de viabilidade, anteprojeto, projeto básico, projeto executivo. No estágio atual, o orçamento de R$ 2,5 bilhões a R$ 3 bilhões inclui investimentos como construção do canal para conexão das represas, 20 eclusas, lagos, áreas de manobra – obras que, segundo Delijaicov, seriam entregues paulatinamente de forma que o hidroanel pudesse começar a funcionar em etapas.
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