Passados dois meses que as cancelas dos pedágios da freeway foram erguidas, a rodovia escancara o abandono. Sem nenhum tipo de reparo nos 98 quilômetros entre Porto Alegre e Osório desde que o contrato com a Triunfo Concepa foi rescindido, o número de buracos que, há pouco mais de um mês, era de 288, mais que dobrou, chegando a 644. Também há lixeiras transbordando e partes de pneus no meio e nas margens da pista.
No último levantamento visual de buracos feito por GaúchaZH, em 26 de julho, a superintendência regional do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) garantiu que a manutenção iria começar em até um mês. Agora, a promessa ficou para a primeira quinzena de setembro.
A empresa que fará o serviço na freeway está licitada: a paranaense Neovia receberá R$ 90 milhões pelo período de dois anos ou até que a nova concessionária assuma a rodovia. O edital que inclui a estrada e outras três rodovias federais — as BRs 448 (Rodovia do Parque), 386 e 101 — está em andamento e a previsão é de que a vencedora assuma em fevereiro de 2019.
Enquanto a burocracia não é resolvida, quem sofre é o usuário. Pelo levantamento de GaúchaZH, a média é superior a três buracos por quilômetro. Mas o cálculo diz pouco sobre a real situação dos 196 quilômetros, somando os dois sentidos da estrada, já que há trechos curtos que concentram muito buracos, e longos com poucas imperfeições.
O trecho na saída de Porto Alegre em direção ao Litoral, de apenas quatro quilômetros, apresenta 78 buracos – o equivalente a 12% do total da rodovia. Por outro lado, 12 quilômetros do trajeto final de quem está chegando a Osório possuem apenas duas cavidades.
Morador do Litoral Norte e habituado a fazer o trajeto para a Capital semanalmente, Marcos Lewis, 47 anos, lamenta a deterioração da pista.
— É impressionante o número de "panelas" que se formaram. Não caí em nenhuma ainda, porque já sei onde estão e aí desvio — comenta Lewis, referindo-se às cavidades redondas e fundas.
Às vésperas de um feriadão (de 7 de Setembro) e com a proximidade do verão, a preocupação maior é com quem não conhece ou não tem frequentado a freeway, já que as três pistas em cada sentido e a velocidade máxima de 110 km/h são as mesmas de quando havia manutenção da rodovia.
— Mesmo conhecendo a estrada, dirijo devagar para dar tempo de ver os buracos e desviar, mas, quando o movimento aumentar e os veículos em velocidade alta também, não sei como vai ser — observa Lewis.
A falta de manutenção não é a única culpada pelo aumento de buracos na rodovia. Os intensos períodos de chuva, conjugados com o tráfego intenso de caminhões, contribuíram para que as cavidades crescessem de tamanho. Há trechos, como no km 23 no sentido Capital-Litoral, em que o asfalto está descascado por mais de 10 metros, expondo as camadas inferiores da pavimentação. Em outros, como no km 21, a profundidade das fendas chega a cinco centímetros.
EGR ficaria responsável apenas pelo socorro
Os problemas da freeway vão além dos buracos: a necessidade de guincho segue a cargo dos motoristas, e o socorro médico cabe às prefeituras. Na tarde de quarta-feira, o motorista de aplicativo Fabrício Freitas da Silva, 32 anos, transportava passageiros quando a correia do seu carro arrebentou. Além de perder a corrida e de desembolsar R$ 100 para pagar um guincho particular, o que mais lhe incomodou foi o tempo de espera.
— Fiquei mais de meia hora tentando contatar guincho. Dei sorte quando um passou e parou aqui. Antigamente, a Concepa chegava em 15 minutos. Agora, a gente não paga pedágio, mas tem de contar com a sorte — pontua o morador de Alvorada.
Se os planos do governo federal derem certo, a rodovia será delegada à Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR), que cobraria a cobrar pedágio. Com a arrecadação, bancaria os serviços de guincho e socorro médico. A manutenção da pista seria de responsabilidade da empresa já licitada pelo Dnit.
A informação é do chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, que é pressionado por prefeitos das oito cidades cortadas pela rodovia. Eles não querem permanecer com o serviço de ambulâncias:
— A negociação depende muito mais da EGR e do governo do Estado do que do Ministérios dos Transportes. Aqui, no governo federal, está tudo pronto.
Presidente da EGR, Nelson Lídio Nunes diz que a proposta foi cogitada, mas que a decisão cabe à Secretaria Estadual de Transportes. A pasta informa que "o governo está realizando a análise jurídica da proposta".
Por outro lado, a antiga concessionária segue tentando reassumir a via. Depois de liminar ter concedido à Concepa permissão para voltar a operar a freeway e a BR-116, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região derrubou a decisão. A concessionária se manifestou à Justiça, voltando a alegar necessidade de prorrogação do contrato para obter "reequilíbrio contratual" por investimentos feitos.
A Concepa, porém, está no centro de suspeitas levantadas por órgãos de fiscalização. Um parecer da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) indicou que a empresa teria maquiado trechos da freeway antes de fiscalização para mascarar problemas. Um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) indicou que a companhia teria tido lucro irregular de R$ 72,4 milhões durante um ano, no período de renovação do contrato após o fim da concessão. Isso porque as tarifas ficaram acima do valor de que deveria ser cobrado dos usuários.
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