Um senador ausente e dois votos rebeldes da base governista explicam o clima de festa entre os senadores da oposição no Senado Federal na tarde de ontem, após o relatório da reforma trabalhista elaborado por Ricardo Ferraço (PSDB-ES) ter sido rejeitado pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS), por 10 votos a 9. No lugar do relatório dele, o colegiado preferiu aceitar o voto em separado do senador Paulo Paim (PT-RS), que recomenda a rejeição total do projeto.
Até o momento, essa foi a primeira derrota da base governista no Senado em relação à proposta que pretende mudar mais de 100 pontos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Agora, o projeto segue para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde deve ser votado na quarta-feira, 28. O parecer do relator da CCJ, Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo na Casa, será lido a partir das 9h de hoje.
Surpreso com o resultado da CAS, Jucá confessou que esperava aprovação por 11 a 9. Os votos que viraram o jogo foram dos senadores Hélio José (PMDB-DF) e Eduardo Amorim (PSDB-SE), que, apesar de serem de partidos da base aliada, disseram não à reforma. O voto do tucano é preocupante porque abala o discurso de que o partido “pode discordar quanto à permanência na base aliada, mas é a favor das reformas”, enquanto o do peemedebista é visto como “desvio dentro do esperado”.
Também prejudicou o governo a ausência do senador Sérgio Petecão (PSD-AC), que estava em seu estado natal e não conseguiu chegar a Brasília a tempo da votação. Ele foi substituído pelo suplente, Otto Alencar (PSD-BA), que já havia se posicionado contra a proposta na comissão anterior, de Assuntos Econômicos (CAE), e reforçou a rejeição na CAS.
Inesperado
Inesperado tanto pela oposição quanto pela base, o placar sinaliza uma virada na conjuntura, já que o mesmo relatório tinha passado com 14 votos favoráveis e 11 contrários na CAE. Embora ontem, em entrevista coletiva na Rússia, o presidente Michel Temer tenha minimizado a perda e dito que não se surpreendeu com o resultado, que considerou “muito natural”, a conclusão geral é que o governo errou na conta e agora precisa reparar o dano. “Todo mundo tomou um susto, porque a reforma era dos poucos bons sinais imediatos para a recuperação dos investimentos e retomada do emprego”, avaliou um especialista em relações de trabalho.
Com opinião parecida, um dos líderes da base aliada na Câmara disse que a derrota acendeu “todas as luzes vermelhas”, já que o governo conseguia, até então, passar a imagem de que aprovava as matérias, mesmo com algum atraso. “Agora, não. Ele perdeu. Não adianta fazer discurso, tem que agir para reparar o estrago que foi feito”, disse, preocupado.
Na opinião da advogada trabalhista Sandy Rodrigues, da Brugnara Advogados, a reforma está comprometida pela situação política instável do país. “Embora eu defenda a necessidade da reforma, imagino que, diante desse quadro, a matéria não passe no plenário”, comentou. O problema, segundo ela, é mais político que técnico.
Sem mudanças
O governo, no entanto, continua confiante e, por isso, mantém o mesmo calendário. O plenário receberá os três relatórios (da CAS, da CAE e da CCJ), e caberá à maioria dos senadores escolher qual será acolhido. “A maioria simples vai ganhar no plenário tranquilamente”, disse Temer, que considera a vitória “certíssima”. “Teremos a aprovação por uma margem bastante dilatada de votos”, concordou o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, que se manifestou por vídeo nas redes sociais após o resultado desfavorável na CAS.
Para Padilha, perder na comissão e vencer no plenário é algo “corriqueiro”. Tanto ele quanto o presidente Michel Temer e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, que também divulgou vídeo comentando o assunto, aproveitaram para lembrar que o mesmo aconteceu na Câmara dos Deputados com o projeto. “É um processo legislativo normal”, disse Meirelles.
Segundo o advogado Fabio Chong, da L.O. Baptista Advogados, o resultado pode ser contornado. “Ninguém estava esperando, nem o governo. Mas as comissões estão lá para opinarem sobre o projeto. Não é a decisão definitiva”, lembrou. Para ele, apesar do revés, o governo, de fato, conseguirá aprovar no plenário com “alguma tranquilidade”.
Segundo Jucá, “o jogo está um a um”. Caso um dos relatórios favoráveis à reforma seja aprovado também no plenário, o texto seguirá diretamente para sanção presidencial. Mas, se o voto do senador Paulo Paim (PT-RS), escolhido na CAS, que pede a rejeição integral da matéria, for aprovado pela maioria dos senadores, a reforma será engavetada. Além disso, se o plenário decidir mudar o texto, o projeto precisará voltar para a Câmara dos Deputados, o que o governo tem evitado a todo custo. Caso Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) considere a reforma inconstitucional, a matéria morre antes mesmo de chegar ao plenário.
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