O crescimento surpreendente da economia brasileira no segundo trimestre mostra uma economia que está demorando mais do que o esperado para desacelerar, em resposta a uma taxa de juros acima dos 13%, e descarta a possibilidade de que o Banco Central acelere os cortes na Selic.
Divulgado na sexta-feira (1), o Produto Interno Bruto (PIB) do país cresceu 0,9% entre o primeiro e o segundo trimestre, número bem mais alto do que as expectativas, que estavam entre 0% e 0,3%.
Isto levou a uma série de revisões para cima para o crescimento da economia brasileira neste ano. As mais otimistas já falam em alta de 3% ou mais.
De acordo com economistas consultados pela CNN, esse retrato de uma economia mais aquecida impede que o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC considere fazer cortes mais agressivos nos juros, e reforça a trajetória que o colegiado já vinha anunciando para a taxa, de novos cortes de 0,5 ponto nas próximas reuniões.
“Quando a inflação medida pelo IPCA-15 veio mais alta do que o esperado, já ficou mais ou menos claro, ali, que o espaço para um corte de 0,75 ponto não existe“, disse o economista-chefe da Órama Investimentos, Alexandre Espírito Santo.
“A chance de que o Copom faça um corte diferente de 0,5 ponto é próxima de zero”, afirmou.
O IPCA-15 é a prévia da inflação mensal, e o resultado referente aos 15 primeiros dias de agosto foi divulgado no fim do mês, elevando a inflação acumulada em 12 meses para 4,24%.
Altas moderadas
Depois de um ano estacionada nos 13,75%, a Selic teve seu primeiro corte no começo de agosto, quando foi reduzida em 0,5 ponto, para 13,25%.
Em seus comunicados, o Copom já sinalizou que os próximos cortes deverão ser da “mesma magnitude”, ou seja, também de 0,5%.
Parte do mercado, entretanto, seguiu “apostando” em um avanço no ritmo para cortes de 0,75. Isto é mensurado pelos economistas por meio das tendências dos juros futuros, definidas pelas negociações feitas diariamente entre investidores.
“Apesar da sinalização do Banco Central de que era muito pouco provável acelerar o ritmo dos cortes, o mercado não tinha acreditado realmente, e chegou a ver uma probabilidade razoável de que isso pudesse acontecer”, disse o economista-chefe da Constância Investimentos, Alexandre Lohmann.
“Mas com o IPCA acima do esperado e algumas declarações de integrantes do Copom, essa expectativa por cortes adicionais começou a ser reduzida, e o PIB acima do esperado reforça isso.”
De acordo com Lohmann, as projeções tanto de inflação, quando de juros, devem mudar pouco para 2023, mas podem acabar mais altas para 2024.
“O que deve acontecer é mudar a taxa terminal”, disse ele. A “taxa terminal” é o valor da Selic depois que o BC encerre todo o seu ciclo de cortes, o que pode durar meses e, no caso atual, deve chegar apenas em meados de 2024.
“Se a economia cresce mais do que o esperado, o mais provável é que o Banco Central continue fazer cortes na mesma velocidade [de 0,5 ponto cada], mas pode encerrar os cortes antes.”
Atualmente, a previsão do mercado é que esta “taxa terminal” será de 9%, que é a previsão média atual do mercado para a Selic ao fim de 2024, de acordo com o Boletim Focus, relatório semanal do BC que acompanha as projeções de bancos e consultorias para os principais indicadores econômicos.
Desaceleração à frente
Rafael Perez, economista da Suno Research, destaca que a expectativa de que a economia já esteja mais fraca em 2024, mesmo com o crescimento mais robusto agora, ajuda a segurar as pressões sobre a inflação e os juros até lá.
“Em 2024, caso a economia brasileira esteja operando muito próximo do seu PIB potencial, podemos ter maiores pressões que impeçam uma queda mais forte dos juros”, disse ele, mencionando pontos de atenção como o nível de consumo e o mercado de trabalho, que pode ver um aumento na taxa de desemprego até lá.
“Ainda assim, em nosso cenário para 2024 esperamos um crescimento menor do PIB, o que deve favorecer um comportamento mais benigno dos preços e diminui as chances de mudanças no ritmo de queda da Selic”, acrescenta.
O economista-chefe da Toro Investimentos, Lucas Carvalho, menciona também o fato de que as principais “ameaças” de inflação, atualmente, vem por choques de oferta, e não de demanda, e por fatores que fogem do controle da taxa de juros do país.
É o caso do preço do barril de petróleo, que é negociado globalmente em bolsas internacionais, e, com ele, dos combustíveis, que abastecem os fretes no Brasil e acabam impactando em várias coisas.
“A inflação está vindo muito mais por uma pressão de custos do que de demanda”, disse ele.
“Já temos hoje a maior taxa de juros reais do mundo, então há espaço, sim, para realizar mais cortes, e o desempenho da atividade econômica não muda essa dinâmica.”
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