Embora as principais projeções do governo e de consultorias indiquem que os produtores brasileiros estão semeando aquela que será a segunda maior safra de grãos da história do país, menor apenas que a colhida neste ano, há riscos climáticos que poderão comprometer parte do grande volume previsto, principalmente de milho.
Não é novidade, nem surpresa, que o clima "ideal" do ciclo 2016/17 não esteja se repetindo na temporada atual, o que justifica as quebras – modestas – previstas nos levantamentos divulgados ontem pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É a possibilidade de formação do fenômeno La Niña que ainda poderá resultar em problemas maiores.
Segundo a Conab, a área cultivada total alcançará 61,5 milhões de hectares em 2017/18, em baixa de 0,9%, e a produção deverá recuar 4,7%, para 226,5 milhões de toneladas. Com o clima menos favorável, a produtividade média de todas as culturas está estimada pela estatal em 3.686 quilos por hectare, 5,6% mais baixa, puxada por uma retração de 9% prevista para o milho que será colhido no verão. De acordo com o IBGE, a produção vai totalizar 219,5 milhões de toneladas, uma redução de 9,2%.
Mesmo que prevaleça o maior percentual de queda estimado pelo IBGE, tendem a ser moderados em 2018 tanto o reflexo negativo sobre o Produto Interno Bruto (PIB) da agropecuária brasileira quanto a pressão dessa menor oferta sobre a inflação, já que ainda será uma safra polpuda e há estoques de diversos produtos à disposição. O sinal de alerta vai acender, nas duas frentes, se o rombo por acaso se aprofundar.
Para Marco Antônio dos Santos, da Rural Clima, no momento não há motivos para que ninguém perca o sono, apesar de o Escritório de Meteorologia da Austrália ter identificado condições para o La Niña se formar. "Claro que a produtividade não será igual à da safra 2016/17. Mas, até agora, tudo indica que vamos voltar a registrar um resultado dentro da média, com algumas quebras pontuais. Mas isso é normal", afirmou ele.
O La Niña, caracterizado pelo resfriamento das águas superficiais da porção equatorial do Oceano Pacífico, está associado a uma menor regularidade de chuvas no Sul do Brasil. Em anos nos quais o fenômeno mostra os dentes, não são incomuns precipitações abaixo da média ou veranicos no Paraná e no Rio Grande do Sul, segundo e terceiro maiores Estados produtores de grãos do país. A liderança é de Mato Grosso, que costuma enfrentar mais problemas com o El Niño.
"O que está acontecendo é a presença de um bolsão de água fria no Pacífico, onde as temperaturas estão realmente bem abaixo da média. Mas ainda não se pode falar oficialmente que estamos passando por um La Niña", afirmou Santos. Segundo ele, essas condições deverão se manter até o começo do ano que vem. Assim, observou, haveria boas condições pluviométricas no Sul no verão – e as perdas da produção seriam contidas.
É confiando nesse cenário que a Conab estima que a colheita de soja do país vai atingir 109,2 milhões de toneladas em 2017/18, 4,3% a menos que no ciclo anterior, e que o volume total de milho chegará a 92,2 milhões de toneladas, em queda de 5,7%. Mas aqui há uma "armadilha": a estatal ainda não mediu as intenções de plantio para a segunda safra de milho da temporada e repetiu, no levantamento que divulgou ontem, a área de 2016/17, a maior da história. Dessa forma, a colheita prevista também está no mesmo patamar recorde alcançado (67,2 milhões de toneladas).
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