‘O receptador de carga roubada está numa situação muito cômoda’
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Por Roberto Mira

Meu envolvimento com o assunto ‘roubo de cargas’ começou em 1997, quando assumi a Coordenação da Assessoria de Segurança e do Grupo de Trabalho de Combate ao Roubo de Cargas (GTCRC), que na época existia no SETCESP. Nesse mesmo período também assumi a Coordenação da Comissão Nacional de Combate ao Roubo de Carga da NTC&Logística.

Desde então tenho acompanhado de perto os números que envolvem este crime. Os dados mais recentes são estes de 2022, fechamos com um total de 13.089 ocorrências de roubo de cargas, conforme divulgado pela NTC&Logística.

Se compararmos com 2017, onde houve o maior número de ocorrência nos últimos 10 anos, é uma redução de quase 50%. Embora essa mesma comparação entre 2017 e 2022, em termos de valores subtraídos, se revele bem menor. Uma diferença de R$370 mil reais.

Isso demonstra que os bandidos se especializaram nesse crime, e estão escolhendo suas vítimas a dedo. O crime está tão organizado a ponto de saber o que cada empresa transporta. E, claramente, eles estão de olho nas empresas que carregam cargas de alto valor agregado.

O ladrão de carga tem roubado por encomenda. Na outra ponta, ele encontra o receptador da carga roubada, que de fato está numa situação muito cômoda. Já temos medidas lá no Congresso para aumentar o apenamento dos infratores, mas que infelizmente, não andam.

Só quem tem a tecnologia do rastreador da carga – sem ser a do caminhão, consegue provar que o produto receptado é fruto de roubo. Essa tecnologia é basicamente um chip que chamamos de ‘isca’, em que colocamos junto com a mercadoria do cliente dentro das caixas na hora do carregamento. Então, se localizarmos a carga dentro de um estabelecimento suspeito, há como provar que ele é fruto de roubo.

São Paulo e o Rio de Janeiro são responsáveis por 85% das ocorrências desse tipo de crime, no Brasil. E, obviamente, se rouba mais aqui, porque também é o eixo econômico do país. A região onde se vende facilmente as mercadorias roubadas.

O mais grave de tudo isso é que alguns estados não estão mais dando continuidade ao Procarga que foi um programa de Combate ao Roubo, Furto e Receptação de Cargas criado há alguns anos, que engloba um grupo de representantes dos organismos policiais, judiciais e do setor privado.

Aqui em São Paulo eram um total de nove instituições, que incluíam Polícia Militar, Polícia Rodoviária do Estado, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Federal, Ministério Público entre outros órgãos. No começo, nós transportadores participávamos ativamente com as forças de segurança nestas reuniões do Programa.

Nós precisamos que o Procarga volte a funcionar como já funcionou anos atrás. Aliás, temos dado bastante ênfase à desatenção das Secretarias de Segurança dos estados em relação ao Procarga.

As entidades do setor já estão verificando o que pode ser melhorado junto às forças de segurança para combater o crime de roubo de cargas. Eu mesmo, sempre cobro às autoridades.

Agora, aconselho também que todo empresário dê a devida atenção a este assunto, e mais uma vez aviso, que fale com seus parlamentares para tirar das gavetas lá do Congresso as ações que nós temos, para a punição do receptador de carga roubada.

Outra coisa é a questão do saque. Também há Projetos de Lei como o nº 3143/23, que pretende penalizar com mais rigor a pessoa que comete estes crimes, incluindo a pena de reclusão de três a oito anos, se o roubo for proveniente de cargas de veículos acidentados em rodovias.

Deixo as minhas recomendações para que as empresas que trabalham com carga de alto valor agregado tomem cuidados, como ter o caminhão rigorosamente rastreado, com câmeras e iscas de segurança. Os empresários têm que se prevenir com dispositivos de segurança, ajudando no combate ao crime. Escolta armada também funciona.

Se nós transportadores decidimos oferecer ao mercado esta atividade de transporte então, temos que prestar um bom serviço. O bom serviço de transporte passa pela segurança dos produtos dos nossos clientes.

Não é só pôr o caminhão na estrada, nosso trabalho só acaba na entrega final, em que a carga é recebida perfeita, sem faltar nada, sem roubo algum e sem que qualquer coisa esteja quebrada.

Eu penso que assim nós vamos caminhar positivamente. Eu tenho esperança que nós vamos baixar mais esses índices.

Roberto Mira é vice-presidente do SETCESP e vice-presidente de segurança da NTC&Logística.


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