Um carro elétrico para três passageiros do tamanho de um SUV grande que pode ser dirigido nas ruas e voar de forma autônoma por cima dos congestionamentos. Isso mesmo. Um carro voador. Há 1 mês a startup NFT apresentou o protótipo do Aska e divulgou planos de iniciar testes de voo já no primeiro trimestre de 2020 e a comercialização a partir de 2025. Para voar, o usuário poderá dirigir o carro até uma área aberta, abrir as asas e decolar verticalmente para uma viagem de até 150 milhas sem piloto, sob o comando da Inteligência Artificial. O carro irá aterrissar em outra área aberta e o motorista assume novamente o volante até o destino final.
A Deloitte estima que o mercado americano para aviões elétricos para decolagem e aterrisagem vertical (EVTOL) será de US$ 6,8 bilhões em 2035 e poderá chegar a US$ 17,7 bilhões em 2040 com a queda dos custos da tecnologia e uma maior aceitação dos usuários.
Uber, Airbus e Boeing se apressam para garantir espaço no mercado de veículos voadores para táxi aéreo nas cidades, mas construir um carro voador confiável não vem sendo uma tarefa fácil e há ainda a necessidade de regulamentações que não comprometam a segurança do trafego aéreo. Um acidente ocasionado pela pressa de lançar o produto pode colocar em risco o sucesso dessa indústria. Mas, assim como já está acontecendo com os drones, em um futuro não muito distante deveremos ver carros voando por aí.
Tem coragem? 😉
Se considerarmos a rápida adesão dos usuários a novos meios de transporte é provável que muita gente embarcaria no carro voador da NFT. Especialmente numa cidade como São Paulo onde a circulação de helicópteros faz parte da rotina. Com a saturação da frota de automóveis particulares que contribuem para poluição e geram altos custos públicos com acidentes nas grandes cidades, é crescente o desejo por veículos alternativos mais rápidos, econômicos e sustentáveis.
Como consequência, estamos assistindo a um ‘boom’ em grandes cidades mundo afora de novos serviços de micromobilidade, um mercado que deverá movimentar entre US$ 200 bilhões e US$ 300 bilhões até 2030, de acordo com a CB Insights. Segundo a Frost & Sullivan, até 2020 devem surgir 150 novos veículos. O novo mercado já está atraindo o interesse até mesmo das grandes montadoras. No final do ano passado, a Ford divulgou a compra por US$ 100 milhões da Spin, empresa de aluguel de patinetes elétricos fundada em San Francisco há dois anos.
A micromobilidade é definida como pequenos modos de transporte com peso inferior a 500Kg, propulsionados por humanos ou motores elétricos, com velocidade abaixo de 50 km/hora e que servem as chamadas “primeira e última milha”, realizando a interconexão com o transporte público de massa. O termo foi pronunciado pela primeira vez por Horace Dediu, em setembro de 2017, no Tech Festival, realizado em Copenhagen.
O mercado em São Paulo, por exemplo, é muito promissor, já que 53% dos 40 milhões de deslocamentos na cidade podem ser realizados com patinetes e bicicletas, segundo o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap). Já um estudo realizado pela consultoria norte-americana McKinsey revela que 60% dos deslocamentos em todo o mundo são realizados em distâncias menores do que oito quilômetros.
Em São Paulo, 80% do espaço das ruas é destinado aos automóveis, o que acaba por gerar conflitos entre ciclistas e motoristas. O estudo do Cebrap avaliou possíveis impactos positivos da bicicleta no lugar de carros e ônibus. Seria possível uma redução de R$ 34 milhões nas despesas do Sistema Único de Saúde (SUS) com internações causadas por diabetes ou doenças cardiovasculares. O relatório também estimou quanto a economia da cidade de São Paulo ganharia com esta opção mais rápida: nada menos que R$ 870 milhões.
Mas o rápido avanço da indústria mundial de veículos de micromobilidade fez acender o sinal amarelo para os riscos que possam trazer e já estão trazendo para segurança dos usuários. Toda inovação em áreas sensíveis como transporte urbano demanda o estabelecimento de regras que ajudem a prevenir acidentes fatais. A pedido do Procon de São Paulo, o Corpo de Bombeiros do Estado divulgou o número de feridos em acidentes com patinetes na capital paulista entre janeiro e abril deste ano: foram 274 ocorrências.
Empresas como Tembici, Yellow, Grin, Serttel, Bird, FlipOn, Lime e Trunfo são algumas das representantes deste novo mercado que, de uma hora para outra, seguindo tendência que começou na Califórnia e se espalhou por outros grandes centros dos Estados Unidos e pela Europa, colocaram centenas, milhares de patinetes e bicicletas elétricas nas ruas das grandes capitais do País, o que levou o a Prefeitura de São Paulo a impor restrições depois dos registros dos primeiros acidentes.
A Política Nacional de Mobilidade Urbana, que foi publicada em 2012, não considera a categoria de micromobilidade. O Decreto 58.750, de 13 de maio de 2019, trouxe regras provisórias, como a velocidade máxima limitada em 20 km/h, proibição de circulação em calçadas e em vias onde os limites de velocidade sejam superiores a 40 km/h.
Ficou estabelecido que as locadoras teriam de se credenciar junto à Administração e cuidar da segurança dos equipamentos e dos condutores, obrigando-os a usar capacetes (exigência depois extinta pela Justiça) e trafegar somente em vias, ciclovias e ciclofaixas. Nas calçadas, a circulação foi terminantemente proibida. As multas fixadas podem chegar a R$ 20 mil e são aplicadas às operadoras, que podem repassar aos usuários.
Na Europa aconteceu um acidente fatal envolvendo um patinete elétrico na Catalunha, aumentando a tensão e levando ao banimento total do serviço de aluguel de patinetes em Barcelona. Em Los Angeles, nove pessoas se machucaram com patinetes elétricos e entraram com uma ação coletiva em outubro no Tribunal Superior do Condado. O processo acusa as startups Bird Rides e Lime, assim como as fabricantes Xiaomi e Segway, de negligência grave, alegando que as companhias sabiam que as patinetes eram perigosos e os implantaram de uma maneira que certamente causaria ferimentos.
Já a Ministra dos Transportes da França, Elisabeth Borne, anunciou recentemente a proibição dos patinetes elétricos nas calçadas de Paris. A lei, que entra em vigor a partir de setembro, prevê aplicação de multa de 135 euros para quem não respeitar o novo regulamento. Diversas regras passarão a regular a circulação dos chamados “dispositivos motorizados de movimentação pessoal” (EDPM, sigla em francês), como patinetes e monociclos elétricos, segways ou hoverboards. O limite de velocidade será de 25 km/h e 2500 vagas de estacionamento devem ser criadas até o final do ano. Atualmente, um total de dez empresas estão operando na capital francesa.
Outro desafio é o vandalismo. No Reino Unido, a Mobike informou que 10% de sua frota foi destruída ou roubada em 2018. E a GoBee deixou o mercado europeu depois que 60% da sua frota ficou destruída e danificada apenas quatro meses após o lançamento.
O mau uso dos equipamentos é uma preocupação das empresas e dos governantes. Segundo o New York Times, as mais de 16 milhões de bicicletas compartilhadas criadas na China por mais de 70 empresas inundaram cidades como a já lotada Beijing ou em Xangai, onde há uma bicicleta para cada 16 habitantes. Elas acabam abandonadas em calçadas e ruas, comprometendo o trânsito já caótico das grandes cidades chinesas, penduradas em árvores, enterradas em campos de construção ou arremessadas em rios.
Sabemos que no Brasil também há grandes desafios para garantir a segurança da micromobilidade. São raras as vias que têm pavimentação adequada para o trânsito de um patinete, e as vias principais, geralmente com melhor pavimentação, são muito rápidas para este tipo de veículo.
A discussão das regras é fundamental para que a inovação traga as soluções que precisamos para uma convivência mais pacífica entre quem opta por carro, bicicleta, patinete, ônibus ou, em pouco tempo, táxis voadores.
O que não pode acontecer é o arcabouço legal e a burocracia frearem o avanço de novas soluções. Regular é muito importante, mas na medida certa e com bom senso. Toda transformação impõe a quebra de velhos paradigmas.
Ou você embarcaria de olhos fechados em um voo sem piloto e sem torre de controle?
(*) Michel Levy é do conselho de Administração da Omnilink, empresa que oferece integração de soluções para segurança e prevenção de risco, gestão de frotas, monitoramento de veículos e telemetria.
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