Jornada excessiva está entre as principais causas de acidentes com motoristas
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O excesso de jornada de trabalho é uma das principais causas de acidentes com transportes de cargas nas estradas. Segundo especialistas, do ponto de vista dos riscos inerentes ao trabalho, a duração da jornada adequada é fundamental. Em um levantamento realizado pelo SOS Estradas foram analisadas 363 colisões fatais entre automóvel e caminhão, nas quais morreram 17 ocupantes de caminhão e 605 de automóveis.

De acordo com o estudo, a causa dos acidentes tem origem num sistema de exploração, que, muitas vezes, é análogo ao trabalho escravo com poucas horas de sono diárias, o que leva muitos ao uso de drogas para suportar a longa jornada de trabalho. Estimativa do SOS Estradas indica que, entre 2016 e 2021, com a exigência do exame toxicológico de larga janela, mais de 3,5 milhões de condutores profissionais desapareceram do mercado. O indício do elevado índice do uso de drogas é a chamada “positividade escondida”.

Ainda segundo o estudo do SOS Estradas, o uso de substâncias psicoativas e outras exigências absurdas no transporte criam as condições ideais para a concorrência desleal prejudicando os profissionais que não aceitam trabalhar em condições desumanas, assim como as transportadoras e embarcadores (donos da carga) que respeitam a legislação. Vale destacar que jornadas de trabalho excessiva e descanso inadequado dos motoristas são apontados entre os principais fatores contribuintes para acidentes.

Fiscalização

Segundo o diretor de Operações da Polícia Rodoviária Federal, Djairlon Henrique Moura, dezembro e fevereiro são os períodos que ocorrem mais acidentes com mortes. E chama atenção para a maior fiscalização desses meses. A partir de 2010, a Polícia Rodoviária Federal adotou diversas iniciativas para a segurança viária. Um dos destaques é a Rodovida, iniciativa que se tornou um programa do governo federal.

As ações adotadas pela PRF foram fundamentais na queda efetiva de mortes em acidentes de trânsito em rodovias federais. Além disso, a iniciativa privada e as entidades da sociedade civil organizada podem contribuir para garantir que o transporte seja mais seguro e que haja uma efetiva redução de autuações de infrações decorrentes da má conduta dos motoristas e demais atores do universo do transporte de carga.

Maio Amarelo

Outra campanha divulgada por Djairlon Henrique Moura é o Maio Amarelo. O movimento tem o objetivo principal de chamar a atenção da sociedade para o alto índice de mortes e feridos no trânsito em todo o mundo, sendo uma ação coordenada entre o poder público e a sociedade civil.

A intenção é colocar em pauta o tema segurança viária e mobilizar toda a sociedade, envolvendo os mais diversos segmentos: órgãos de governos, empresas, entidades de classe, associações, federações e sociedade civil organizada.

São três mil vidas perdidas por dia nas estradas e nas ruas, sendo a nona maior causa de mortes no mundo. Os acidentes de trânsito são o principal responsável por mortes na faixa de 15 a 29 anos de idade; o segundo, na faixa de 5 a 14 anos; e o terceiro, na faixa de 30 a 44 anos. Atualmente, esses acidentes já representam um custo de US$ 518 bilhões por ano ou um percentual entre 1% e 3% do Produto Interno Bruto (PIB) de cada país.

Jornadas excessivas

Felipe Ricardo da Costa Freitas, superintendente de Fiscalização de Serviços de Transporte de Cargas e Passageiros da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), reforça que um dos principais motivos para os acidentes nas estradas é a jornada de trabalho ininterrupta do motorista.

A pesquisa mostra que, em 15% dos acidentes com caminhões nas rodovias federais, os motoristas estavam dirigindo por mais de quatro horas. Outra pesquisa, feita pela Pancary Logística, mostra que o motorista típico dorme menos de três horas por dia.

Ele também alerta para as condições dos caminhões e ônibus usados por profissionais. “Muitos veículos se encontram em condições precárias, com o pneu careca, sem cintos de segurança e outros problemas.”

De acordo com dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), 25% dos acidentes de trânsito em rodovias ocorrem por veículos de transporte de carga ocasionando 15% dos óbitos e 7% de casos de invalidez permanente.

O vice-coordenador nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho (Codemat) do MPT, Luciano Lima Leivas, explica que os principais fatores de risco de acidentes de trânsito e de trabalho, segundo informações do DNIT, são a organização do trabalho, forma de remuneração, longa duração de trabalho e segurança pública.

De acordo com a lei 13.103, a jornada diária do motorista é de oito horas, podendo ser prorrogada por mais duas ou quatro horas em caso de acordo coletivo.

“Por que a organização do trabalho leva aquele motorista ao cansaço? Culpabilizar apenas o motorista pelo acidente é equivocado, precisa-se pensar de forma mais ampla. Pensar nos fatores da organização do trabalho que levaram aquele motorista a uma situação extrema está muito imbricado com a causa do acidente. Principalmente a remuneração por produção leva o motorista a longas viagens exclusivamente o motorista autônomo”, afirma Luciano Leivas.

“São números assustadores que mostram o grau de exploração dos profissionais da estrada e a falta de cuidado dos demais condutores quando estão trafegando onde tem caminhões. Existem os sinistros por fadiga e abuso dos caminhoneiros, mas muitas ocorrências são fruto da imperícia e imprudência dos motoristas de veículos leves. Entretanto, tudo começa numa concorrência desleal que leva inclusive ao uso de drogas”, explica Rodolfo Rizzotto, coordenador do SOS Estradas.

Uso de drogas

Renato Dias, presidente da Associação Brasileira de Toxicologia (ABTOX), explica que a exigência do exame toxicológico em larga escala é essencial para a detecção de drogas consumidas por motoristas de caminhão e ônibus.

Uma pesquisa realizada pelo projeto Comandos de Saúde nas Rodovias em São Paulo, feita em um período de oito anos, revelou que 7,8% dos motoristas de caminhão no Brasil fazem o uso de drogas ilícitas —anfetamina, cocaína e maconha. Realizada com a participação de 4.110 caminhoneiros, indicou que, entre 2009 e 2016, a substância predominante foi a cocaína (3,6%), seguida da anfetamina (3,4%) e da maconha (1,6%).

A Lei 13.103/2015, conhecida como a “Lei do Caminhoneiro”, trouxe a obrigatoriedade da realização do exame toxicológico para os motoristas profissionais de transporte rodoviário de passageiros e de cargas.


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