O governo Jair Bolsonaro estuda mudar o modelo de concessão de rodovias federais. Em vez de exigir pedágios mais baratos, o Ministério de Infraestrutura avalia cobrar outorgas bilionárias nos próximos leilões.
O sistema, semelhante ao adotado pelos governos tucanos no estado de São Paulo desde os anos 1990, abandonaria as concessões que privilegiavam o critério de menor pedágio, que vigorava nas administrações Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff e que sofreram críticas pela inviabilidade econômica que demonstraram na prática.
Caso a proposta vá adiante, o dinheiro arrecadado abastecerá um fundo rodoviário nacional com o objetivo de implementar melhorias e duplicações nas demais vias para que também sejam concedidas.
Estima-se que seja possível cobrar ao menos R$ 1 bilhão na outorga de uma rodovia, como a Rio-Petrópolis, sem que esse valor pressione demais o preço do pedágio.
A ideia de mudar o regime de concessão partiu do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, que busca mecanismos para resolver o problema da malha rodoviária federal durante sua gestão.
Para isso, ele encomendou estudos ao PPI (Programa de Parceria de Investimentos) e à EPL (Empresa de Planejamento e Logística).
"Estamos avaliando esse novo modelo de concessão", disse à Folha o secretário-executivo do PPI, Adalberto Vasconcelos.
Pessoas que acompanham as discussões no ministério afirmam que a proposta do ministro é habilitar a concessão de cerca de 5.400 quilômetros de rodovias nas próximas reuniões do PPI.
Hoje, o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) administra 57,2 mil quilômetros em todo o país, tendo R$ 7 bilhões para conservá-las. Na década passada, o país dispunha do dobro desse valor para rodovias.
O modelo de concessão por outorgas vem sendo usado pelo governo paulista.
No entanto, os recursos serviram para abastecer o caixa único do governo e foram usados para despesas correntes, como o salário de servidores.
Ao criar o fundo rodoviário nacional, a equipe de infraestrutura de Bolsonaro quer carimbar esse recurso para torná-lo imune ao contingenciamento do Orçamento, que, neste ano, será restritivo.
As rodovias que estão já mapeadas pelo PPI, como a BR-364-365 e a BR-163, não entrarão nesse plano.
Já as relicitações de NovaDutra (Rio-São Paulo), Concer (Rio-Juiz de Fora) e CRT (Rio-Teresópolis) —cujos contratos vencem em 2021 e não foram renovados por Michel Temer (MDB)— poderão estrear o novo modelo de Bolsonaro.
"A União tem rodovias já construídas, algumas até duplicadas, e concedê-las por outorga seria como cobrar um aluguel por esse investimento já realizado nessas vias", diz o advogado Pedro Dutra, especialista em regulação.
"Usar esse dinheiro para melhorar as outras vias, que hoje não interessam à iniciativa privada, faz todo o sentido."
Para Dutra, no entanto, há um risco. "O problema é exigir uma outorga muito elevada. O concessionário vai acabar repassando para o pedágio".
A dosagem entre outorga e as tarifas é justamente um dos pontos em análise pelos técnicos do ministério e do PPI.
A EPL vai se dedicar aos estudos da própria concessão, que subsidiarão as equipes do governo para decidir se pesam mais na tarifa ou na outorga.
As três rodovias que estão prontas para relicitação, por exemplo, passarão por uma avaliação mais criteriosa, porque, segundo os técnicos envolvidos nos estudos, precisam de novos investimentos.
Na NovaDutra, por exemplo, é preciso construir uma nova pista na serra das Araras, um dos gargalos para o transporte de cargas. Na serra de Petrópolis (Concer), também é preciso uma nova via.
Outras rodovias privatizadas pela primeira vez no governo Dilma também enfrentam problemas.
A recessão prejudicou o modelo de negócios das concessionárias, que passaram a operar com prejuízo ou a sofrer retração do lucro que seria usado para reinvestimento.
Ainda não se sabe se, ao vencerem esses contratos, serão relicitados pelo novo modelo.
Nas gestões do PT, priorizou-se o modelo que buscava pedágios mais baratos, com o maior investimento possível na duplicação e manutenção das rodovias. Isso ocorreu, porém, em cenário de crescimento. Com a crise, as concessões se tornaram inviáveis.
As empresas não conseguiram manter a rentabilidade necessária para fazer frente aos investimentos exigidos pelos contratos.
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