Uma das principais táticas é a mudança, sem explicações técnicas, dos critérios de comparação dos engarrafamentos pela CET (Companhia de Engenharia de Tráfego). Outra foi não divulgar dados detalhados para análise na sexta passada.
A última adaptação para comparar os índices de lentidão se deu na semana considerada como um teste para a avaliação do impacto da proibição ao transporte de cargas, em razão da volta à rotina de aulas -ofuscado pela chuva e dois dias com filas acima de 200 km.
Pelas estatísticas divulgadas pela gestão Kassab entre segunda-feira (4) e quinta-feira (7), mesmo com a tempestade que atingiu a cidade houve melhoria de 3,5% no trânsito em relação a 2007.
A Folha, porém, obteve dados de um outro critério técnico de comparação -adotado pela CET até a semana retrasada, mas que ela se recusou a divulgar em quatro dias da última semana-, sinalizando situação mais desfavorável, com piora de 0,4% da lentidão.
A meta divulgada pela gestão Kassab com a restrição aos caminhões a partir de 30 de junho é atingir uma melhoria da fluidez próxima de 15%.
Especialistas vêem indícios de que a medida traz benefícios à circulação, mas consideram ser cedo para conclusões. Os resultados ruins da semana passada são atribuídos à chuva.
Na última sexta, quando a lentidão atingiu 211 km às 19h -recorde desde que vigora a nova restrição a caminhões-, a opção da CET foi se recusar a fornecer dados comparativos com 2007 pelos dois critérios.
Guerra de números
O parâmetro que a CET passou a se negar a divulgar foi usado, por exemplo, em comunicado distribuído à imprensa no dia 28 de julho: “Índice de lentidão cai 49% na primeira manhã de rodízio de caminhões“.
Por esse mesmo critério, São Paulo teve uma diminuição de 6% dos congestionamentos na última segunda, 4 de agosto. Mas a empresa se recusou a divulgá-lo, apesar dos pedidos, para exaltar uma comparação mais favorável: queda de 10%.
No dia seguinte, novamente a CET só destacou a fórmula mais conveniente: “Apesar da forte chuva, lentidão no trânsito cai 10%“. Pelo outro parâmetro histórico, teria havido piora de 2% dos congestionamentos.
Os dois critérios de análise da situação do trânsito eram divulgados com freqüência pela CET. São eles: a comparação com um único dia equivalente de 2007 (exemplo: 28/07/2008 com 30/07/2007, por serem ambos a última segunda de julho); e a comparação com a média do dia da semana (exemplo: 28/07/2008 com a média das segundas de julho de 2007).
Funcionários da companhia de trânsito dizem que ela omitiu os dados desse segundo parâmetro em alguns dias por terem sido menos favoráveis.
A divulgação é controlada por uma assessoria de imprensa privada, especialista em gestão de imagem, que acompanha todos os passos do secretário dos Transportes e presidente da CET, Alexandre de Moraes.]
Secretário esquece de dados negativos
“Vocês querem os índices?“, pergunta o secretário dos Transportes, Alexandre de Moraes, a jornalistas, no final de uma entrevista nos Jardins. Passava das 16h30 de quarta quando ele informaria a lentidão do dia, em comparação com 2007.
“No horário de pico nós tivemos de novo uma boa melhoria“, diz Moraes, antes de anunciar os dados. Porém, em vez de começar pelo índice das 7h -primeiro da medição oficial da CET-, ele inicia pelo das 8h30.
Após comemorar, ele dá brecha para que a Folha questione sobre os dados das 7h às 8h -os únicos negativos pela manhã. Moraes, então, os revela. Uma jornalista questiona: ficou um pouco mais carregado nesse horário? “Hoje“, diz Moraes.
O secretário atribui a diferença negativa no começo da manhã também nos dois dias anteriores a uma “mudança na metodologia“ -contestada pelo sindicato.
Adauto Martinez, diretor de operações da CET, diz que foi “um aperfeiçoamento“ -agentes passaram a chegar meia hora antes para se organizar melhor. “Mas, se houver diferença, é [só] no horário das 7h mesmo.“
Companhia afirma que comparação e análise de dados são só complemento
A CET informou que divulga os dados de congestionamento a cada meia hora e que os materiais “analíticos e comparativos“ são só “um complemento“.
A assessoria de imprensa da companhia divulgou uma nota, sem responder diretamente às seis questões enviadas.
Não explicou também a razão por que não fornece os dados solicitados (e que estão disponíveis na empresa) e a justificativa para passar a divulgar só os critérios mais favoráveis à gestão Gilberto Kassab (DEM).
A CET também não deu explicação ao fato de, na sexta, quando os congestionamentos atingiram 211 km às 19h, ela não ter divulgado nenhum dos dois parâmetros habituais de comparação com 2007 -apesar dos pedidos-, limitando-se a exibir gráficos na internet (sem os números detalhados).
Na nota enviada à Folha, a CET afirma que “divulga, desde a década de 1980, diariamente, de meia em meia hora, os níveis de lentidão da cidade, que, inclusive, são veiculados por várias rádios“, além de disponibilizar “um site no qual é possível consultar on-line a lentidão […] em cada região e nos principais corredores“. “Esses dados estão disponíveis para toda a imprensa“, diz.
O comunicado afirma que “os releases analíticos e comparativos divulgados […] são apenas um complemento para facilitar o trabalho daqueles que não querem fazer consultas por telefone ou site, sendo produzidos diariamente […] das 7h às 20h“.
A empresa não explicou, por exemplo, por que não forneceu as médias de congestionamento de segundas, quartas, quintas e sextas de agosto de 2007.
A assessoria de imprensa da empresa também não respondeu se, com essa iniciativa, visa divulgar apenas os dados mais favoráveis à CET. A pergunta foi enviada por escrito.
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