A maior parte do que o Brasil produz circula pelas rodovias federais, estaduais e municipais. Atualmente, o modal rodoviário responde por 64,8% da carga movimentada no país, ao passo que trilhos e hidrovias, juntos, somam 20,2% do volume total. Os outros 15% são movimentados por cabotagem, dutovias e transporte aéreo. Além de caminhões, a malha rodoviária recebe um fluxo intenso de carros de passeio e ônibus de viagem, sendo vital para o deslocamento dos brasileiros em tão amplo território.
Diante desse cenário, não é exagero dizer que o desenvolvimento nacional está intimamente ligado à qualidade e à disponibilidade dessas vias. Três décadas atrás, o governo federal teve essa percepção e, acertadamente, propôs o Procrofe – Programa de Concessões de Rodovias Federais. A iniciativa foi um voto de confiança ao setor privado, que assumiu a gestão desses ativos.
Hoje, sabemos que o advento do Procrofe ajudou a proteger a infraestrutura rodoviária de um quadro de dificuldades, já que a restrição orçamentária federal foi sendo exacerbada ao longo dos anos. A título de exemplo, no período de 2016 a 2022, as rodovias federais concedidas receberam, em média, 2,3 vezes mais investimentos por quilômetro do que as administradas pelo poder público federal (R$ 398,03/km e R$ 170,25/km, respectivamente).
Desde 2018, essa proporção vem aumentando ano a ano: em 2021, os investimentos realizados pelas concessionárias foram 3,4 vezes superiores aos investimentos públicos em rodovias federais (R$ 409,05/km e R$ 121,07/km, respectivamente), e, em 2022, 3,8 vezes. Nesse último ano, as concessionárias investiram R$ 486,55 mil/km em rodovias federais, enquanto os investimentos públicos alcançaram R$ 127,42 mil/km.
Por óbvio, a diferença entre os aportes se reflete na avaliação da qualidade da infraestrutura, como costuma registrar a Pesquisa CNT de Rodovias (embora, na última rodada, em 2022, tenha sido constatada a piora geral da malha rodoviária). Faltava, porém, uma avaliação de longo prazo, que expusesse os efeitos duradouros da política de concessões. Essa lacuna acaba de ser sanada com o lançamento pela CNT (Confederação Nacional do Transporte) da “Série Parcerias: A Provisão da Infraestrutura de Transporte pela Iniciativa Privada – Rodovias”.
A publicação analisa, de forma comparativa, as rodovias federais sob gestão pública e privada, levando em conta: investimentos realizados; qualidade; segurança viária; oferta de serviços; tecnologia e inovação; gestão, governança; e sustentabilidade. Além disso, neste documento, a CNT apresenta os desafios para o avanço da agenda de concessões rodoviárias no país e as propostas dos usuários para mitigá-los e superá-los.
Entre as medidas defendidas pela CNT para ampliar e melhorar a agenda de concessões rodoviárias, citarei apenas duas, que considero muito relevantes. A primeira é a construção de uma política de Estado em que a iniciativa privada seja um pilar para o desenvolvimento da infraestrutura de transporte. Observem que ter essa diretriz não significa abrir mão dos recursos orçamentários destinados à malha sob gestão pública, que precisam ser ampliados e, principalmente, executados.
A segunda é dar continuidade aos leilões dos projetos já qualificados no Programa de Parcerias de Investimento (PPI) e em processo de estruturação ou em fase de estudos avançada, viabilizando a licitação de projetos maduros, e com um cronograma bem definido. Deve-se recorrer às PPPs (Parcerias Público-Privadas) para aqueles projetos economicamente inviáveis na modalidade de concessão pura. Que fique claro: nem todos os projetos estimulam o “apetite” do investidor privado.
É mais do que sabido que a CNT apoia a continuidade da agenda de concessões no país. Porém, defende que a expansão das parcerias com a iniciativa privada não exime o Estado de sua responsabilidade e do seu papel de investidor. Há complementariedade entre a provisão de infraestruturas pela iniciativa privada e o investimento público. Essas duas vias caminham em paralelo, mas se encontram no objetivo final, que é a prosperidade do Brasil e do povo brasileiro.
Vander Costa
Presidente do Sistema Transporte (CNT / SEST SENAT / ITL) desde março de 2019. Graduado em Administração, pela UFMG, e em Direito, pela Faculdade Newton Paiva, é um dos fundadores da Vic Transportes (1982), grupo empresarial com atuação no setor rodoviário de cargas.
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