Uma jornada rumo à mudança de mentalidade sobre a saúde mental
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O tema saúde mental ganhou muito espaço nas organizações nos últimos meses em função do impacto que a mesma pode oferecer ao trabalho, principalmente diante de grandes adversidades como a que temos vivido desde o início da pandemia da Covid-19. Mas, na verdade, o alerta já havia sido dado por grandes instituições, como a Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Fórum Econômico Mundial, muito antes. Para ser mais precisa, desde 2016. A mudança de mentalidade, porém, tardou um pouco para acontecer.

Ambas instituições apontaram que os transtornos mentais se tornariam o grande fator de impacto na saúde e na economia até 2020, sem sequer imaginarem o que viria pela frente. O assunto também ganhou a capa de revistas, as páginas de diversas publicações, os programas de TV. Enfim, o alerta estava sendo feito.

Talvez por conta desse destaque do tema na mídia e em outros espaços, algumas ações já vinham sendo implantadas por muitas empresas, no sentido de promover e resguardar o equilíbrio emocional de líderes e colaboradores em suas rotinas de trabalho e de vida.

Aliás, o relatório de tendências de gestão de pessoas em 2021, desenvolvido pelo GPTW Brasil, mostrou este cenário. Dos 1704 respondentes, 36% trabalham em empresas que já desenvolviam algumas ações voltadas ao cuidado com a saúde mental do colaborador mesmo antes da pandemia. Porém, claro, teve uma parcela significativa das organizações que passaram a olhar para o assunto por conta das demandas de 2020: 30% afirmaram que começaram as ações de cuidado devido à pandemia.

Um novo olhar

Esse avanço rumo à promoção de mais práticas voltadas para a saúde mental é importante também no que diz respeito ao preconceito em torno do tema – na verdade, ao combate dele. Até bem pouco tempo atrás, o assunto era carregado de estigma, o que certamente pode ter contribuído para o Brasil ter alcançado índices muito alarmantes de transtornos de ansiedade e depressão. Fomos considerados pela OMS, em 2018, como “o país mais ansioso do mundo” (9,3% da população sofre de ansiedade) e “o mais deprimido” do continente latino-americano (5,8% da população apresenta quadro de depressão). Vale ressaltar que os dados são anteriores a 2020, pois não temos pesquisas muito contundentes relativas ao surgimento da pandemia, justamente porque ainda estamos inseridos no problema.

Ainda sobre o estigma, a pesquisa de tendências citada acima mostra o que talvez possa ser considerado um sinal mais positivo sobre essa visão. É que, quando perguntados sobre como acontece o adoecimento mental, 77% dos participantes responderam que “as doenças mentais têm tanto participação de genes quanto de estressores do meio como relações complexas de trabalho”, contra 2% que ainda diz não acreditar em doenças mentais.

Mesmo diante dessa mudança de mentalidade, é importante lembrar que o assunto da saúde mental ainda não é democrático, ainda não é acessível a todos. Aliás, a verdade é que pouco se falava de saúde mental em indústrias, empresas, escolas e, inclusive, hospitais até algum tempo atrás. E, no entanto, a literatura já apontava o trabalho como um fator relevante para o surgimento e/ou o agravamento de sintomas ansiosos e depressivos, principalmente após a era da globalização, com a fragmentação da atividade laboral, aumento da competitividade, desemprego ou medo dele, carga horária de trabalho excessiva, metas cada vez mais agressivas.

O meio corporativo já não pode ignorar esta temática e deixar de incluí-la em sua pauta focada na mudança de mentalidade, sob o risco de contribuírem para a confirmação da previsão do Fórum Econômico Mundial, em março de 2020. Na época, foi estimado que os gastos com a saúde mental poderiam chegar a 6 trilhões de dólares até 2030. Só para se ter a dimensão desse valor, 6 trilhões de dólares é mais do que a soma dos custos com diabetes, doenças respiratórias e câncer. Outra previsão assustadora é a de que a depressão seria a causa número um de mortalidade até lá.

Certamente, diante das mudanças desencadeadas pela crise sanitária, econômica e política em nosso país desde 2020, estamos todos com um elefante na sala e precisamos não somente falar dele, como nos unirmos para, de forma estratégica e eficiente, contribuirmos cada um em sua área de atuação para debelá-lo. Sim, debelá-lo! Parece utópico, mas algumas empresas já caminham há alguns anos na direção de incorporarem em seus processos e rotinas ações de saúde mental integradas à sua cultura, de forma que sejam reconhecidas por colaboradores e gestores como parte do dia a dia de trabalho.

Importante ressaltar que envolver a liderança é fundamental, uma vez que dar suporte ao time com elementos como empatia e compaixão é crucial. Desta forma, o exercício é de, primeiro, conectar-se com sua própria humanidade para, então, ser capaz de reconhecê-la no outro. “Liderança orientada ao outro”, afirma Tatiana Iwai em um artigo publicado no GPTW. O que pode parecer redundante, uma vez que alguém na função de líder deveria estar ali para servir e orientar o outro, acaba sendo um alerta fundamental para o risco (recorrente) de líderes narcisistas.

Portanto, partindo-se de treinamento para os líderes, valorizando o autoconhecimento por parte dos mesmos, numa lógica de que “o que eu quero para mim, quero para o outro”, pode-se favorecer um clima organizacional promotor de saúde e bem estar. Um ambiente no qual os colaboradores vistam a camisa e se sintam “donos da empresa”, encontrando ali uma fonte de satisfação e de realização pessoal, além de identificação com seu time, algo tão precioso em se tratando de saúde mental. Que possamos aprender a lição de anos negligenciando a saúde mental e, então, transformar nosso olhar sobre isso. Mais ainda, que possamos adotar novas e melhores práticas! No próximo artigo, irei listar algumas delas que podem inspirá-los nessa jornada rumo à mudança de mentalidade quando o assunto é saúde mental.


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