Mesmo com o estado sob Intervenção Federal e com tropas reforçando o policiamento nas ruas, o Rio registrou um total de 6.440 roubos de cargas nos primeiros oito meses deste ano. Uma média de um assalto a caminhão por hora. Um número elevado, mas menor que no mesmo período do ano passado, quando ocorreram 6.931 assaltos entre janeiro e agosto. Um problema que tem custado caro para a economia do estado, como revela uma pesquisa inédita realizada pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), em parceria com a Confederação Nacional da Indústria (CNI). Ela mostra que a insegurança custou R$ 8 bilhões à indústria fluminense em 2017, com reflexos diretos na captação de investimentos do setor.
Batizada de Sondagem Industrial/Especial Segurança, a pesquisa da Firjan apontou ainda que 44,5% das indústrias fluminenses relataram já ter sofrido algum tipo de crime. Na região Sudeste a média foi bem menor: 28,2%. São relatos de roubos e furtos de cargas; roubo de máquinas ou equipamentos; vandalismo e roubo e furto aos colaboradores. Também identificou que a maioria das empresas (60,4%) foi vítima de roubo de cargas, crime em que o estado registrou, em todo ano de 2017, o maior patamar do país: 10.599 registros.
CONTRATAÇÃO DE SEGURANÇA PRIVADA
A radiografia traçada pelo levantamento da Firjan mostrou outros indicadores alarmantes: 51,1% dos empresários tiveram que contratar segurança privada e implantar mecanismo de rastreamento de veículos; e 61% foram forçados a fazer seguros contra roubos e furtos. A pesquisa ainda indicou que 73,6% da indústria fluminense apontou que suas decisões de investimentos são afetadas, em termos de localização de empresas, pela falta de segurança.
O empresário Sérgio Duarte, que atua na área de alimentos e vice-presidente da Firjan, disse que o aumento da repressão aos roubos de cargas levou os ladrões a serem seletivos: no ano passado, quando os números explodiram, qualquer caminhão era atacado.
— Este ano, depois da Intervenção Federal, os ladrões passaram a selecionar seus roubos. Priorizaram os veículos que transportam carne, laticínios, cigarros e bebida — afirmou Sérgio Duarte.
O coronel Venâncio Alves de Moura, diretor de segurança do Sindicato das Empresas do Transporte Rodoviário de Cargas do Rio (Sindicarga), observou que o combate ao roubo de cargas melhorou depois da decretação da Intervenção Federal e que os números estão em queda este ano.
Segundo o coronel Venâncio, já há sinais de melhoras nos índices e na confiança dos empresários do setor de transporte rodoviário.
Venâncio, entretanto, fez um alerta: o período de maior risco começa agora, com a chegada do fim do ano, quando há aumento no movimento de transporte de cargas por causa da proximidade do fim do ano, quando as vendas aumentam com a chegada do Natal.
— Tenho notado um maior empenho das autoridades no combate ao roubo de cargas e no enfrentamento aos grupos responsáveis pelos ataques. O que precisamos agora é ver como a criminalidade reage no período de fim de ano — disse Venâncio.
Diretor-executivo de uma empresa do Rio, Thiago Carlos Trica, do ramo de massas, lembrou que o impacto no aumento da violência foi sentido de várias formas. Ele revelou que a empresa teve nos últimos meses seis caminhões roubados, foi forçada a aumentar custos e acabou sofrendo com a perda da competitividade nacional.
— Nacionalmente perdemos competitividade, com aumento de custo. O frete ficou mais caro. E não foi só isso: quando sofremos um assalto, com roubo da carga e do caminhão, deixamos de atender um cliente. Um prejuízo que não temos como mensurar — contou Thiago.
Na semana passada uma operação de policiais civis do Rio, com mais de 25 pessoas presas, constatou que o roubo de cargas é uma das principais fontes de financiamento do tráfico de drogas e um dos braços do crime organizado que atua no estado. Os traficantes praticam assaltos para consolidar o seu poder e financiar a compra de armas, munição e droga.
O que os policiais precisam trabalhar agora é na identificação da rede de receptadores que permanece na sombra, fora do alcance das autoridades. Um grupo que paga para obter e distribuir mercadorias roubadas, impulsionando o crime que mais cresceu no território fluminense nos últimos anos, deixando um rastro de prejuízo. O mercado de receptação é o assunto que tem mobilizado a Firjan.
— É preciso aumentar a pena do crime de receptação. O roubo só acontece porque tem alguém para comprar. Atualmente a punição para quem é acusado de receptação é branda. Normalmente o acusado paga uma fiança e sai da prisão, vai embora. Então o risco para o receptador compensa — afirmou o empresário Sérgio Duarte.
Previsto no Código Penal, no artigo 180, a receptação é atribuída a quem for pego adquirindo, recebendo, transportando, conduzindo ou ocultando, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte. A pena prevista para o crime é de reclusão de um a quatro anos e multa.
— Precisamos sensibilizar a população também. Comprar um produto de procedência duvidosa, é alimentar o crime. Não existe mágica, a equação é simples: o estado deixa de arrecadar impostos, a empresa fica com prejuízos e pode fechar, levando a demissões — afirmou Sérgio Duarte.
Empresário do ramo de cosméticos, Celso Dantas, disse que a insegurança e a violência têm reflexos dentro da fábrica, entre os funcionários.
— São pessoas que são vítimas de assaltos na periferia da fábrica. Na chegada e na saída do trabalho. Isso acaba causando um problema que não é de natureza material. É um trauma, com desdobramento emocional, psicológico e de produtividade.
Celso Dantas defende que o agravamento da crise na segurança tem como raiz a deterioração da economia do estado.
— A violência, os assaltos, refletem a falta de emprego. O desemprego hoje é, muito provavelmente, o principal causador disso. Eu não estou dizendo que a pessoa está assaltando porque não tem emprego. Não é isso. Mas com certeza a deterioração da economia tem uma parcela importante e é a principal responsável — afirmou o empresário.
Para Celso, a ineficiência do estado também contribui. A falência, segundo ele, faz com que o estado não tenha programas, mecanismos e políticas que consiga conter o aumento da violência.
— Estamos convivendo com um estado falido e com atividade econômica baixíssima. Nós temos que buscar políticas de inserção de pessoas no mercado de trabalho. Se isso não for feito nós vamos continuar a enxugar gelo. Você vai por mais polícia na rua, vai chamar o Exército, a Marinha; vai fazer mais abordagens e não vai conseguir mudar — garantiu Celso Dantas.
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