Ficará aos poucos para trás a parada súbita das atividades e voltará o mais do mesmo da economia de baixo crescimento
A queda do Produto Interno Bruto de 9,7%, sem registro na história do país, apenas coloca mais distante a perspectiva de um crescimento digno deste nome, maior que os 1% em torno do qual a economia brasileira vem rastejando há três anos. Após outros três anos de recessão, baixo dinamismo das atividades e a pancada de queda da renda per capita no segundo trimestre de 2020 – de 5,9% em 12 meses, os brasileiros tem o mesmo nível de recursos que em 2007, há 13 anos. O retrato do desempenho do PIB no segundo trimestre mostra o passado e uma tragédia. Mas algo parecido a essa lamentável realidade pré-pandemia só será retomado em 2022, se tudo der certo.
A recessão atingiu as principais economias do mundo no segundo trimestre, com exceção da China, que havia tropeçado antes, no primeiro trimestre, e encolhido 6,8%. Era previsível que não haveria nada comparável a esta performance desde a Grande Depressão de 1930. Menos previsível, porém, foi a retração brasileira já no primeiro trimestre, período em que o ministro da Economia acreditava que a economia estava alçando voo, até ser abatida pela pandemia. O IBGE refez as contas e o PIB do período caiu 2,5%, e não 1,5% como divulgado antes. Esse é o horizonte: o Brasil vai levar dois anos para chegar ao ponto de quase inanição econômica que estava no fim de 2019.
Há sempre o consolo de que as coisas poderiam ter sido piores. As quedas de -9,7% em relação ao trimestre anterior, e de -11,4% ante o mesmo período de 2019, foram maiores, mas não muito, do que previam os analistas. Por isso e por avaliarem que a recuperação iniciada em maio, e fortalecida a partir de junho, prossegue, as estimativas para o PIB do ano recuam semana após semana e se situam atualmente em -5,28%. A faixa de variação dessas estimativas está hoje, grosso modo, entre -6,5% e -4,5%. Há consenso que em 2021 essa perda não será recuperada. A estimativa do Focus aponta expansão de 3,5% no PIB, enquanto que o governo projeta 3,2% em seu orçamento.
Em termos relativos, o Brasil foi bem melhor que os demais países da América Latina e teve desempenho menos ruim do que Itália, França, Reino Unido e Espanha. A diferença dessa vez foi a enorme rede de proteção social implantada às pressas para empregados com redução de jornada ou trabalho suspenso, e desempregados, assim como garantia de liquidez, empréstimos e juros menores para empresas. Com auxílios emergenciais e para manutenção de emprego e renda foram gastos no segundo trimestre R$ 185,6 bilhões. Isto é equivalente a mais de 10% do PIB trimestral, e 18,5% de todo o consumo das famílias no período.
Os efeitos dessa injeção necessária de recursos foram a recuperação do varejo restrito ao nível pré-pandemia, combinada com o aumento da poupança, que no segundo trimestre foi de 15,5% do PIB, maior do que os 15% do PIB dos investimentos, uma inversão só vista recentemente no início desse século. De forma desigual, a economia retomou o movimento, ainda com baixa mobilidade em setores vitais, como o de serviços, que compõem 70% do PIB pelo lado da oferta, papel semelhante ao que o consumo das famílias tem pelo lado da demanda, com 65%. O primeiro caiu 11,2% em relação ao segundo trimestre de 2019 e o segundo, 13,5%.
A força da retomada dependerá desses dois componentes. Uma boa parte da oferta, abrigado em outros serviços (como hospedagem, turismo, com 17,7% do setor), não se recuperará plenamente tão cedo, pelo menos não até que a covid-19 seja controlada e surja uma vacina. O consumo das famílias aumentará ou não dependendo do nível de desemprego, ainda represado pelo abandono da força de trabalho, e do auxílio de proteção, que cairá à metade a partir de agora.
Dos outros setores espera-se evolução comedida, caso da indústria de transformação (-17,5% ante trimestre anterior) e dos investimentos (-15,4%). As exportações líquidas contribuiram para arrefecer a recessão e deve colaborar positivamente com dois pontos percentuais para o PIB do ano, segundo projeções do Ibre-FGV (Valor, ontem).
Ajudam a recuperação os juros negativos e não a facilitam a penúria dos investimentos públicos e a alta ociosidade, que tolhe o investimento privado. Dessa forma, ficará aos poucos para trás a parada súbita das atividades e voltará o mais do mesmo da economia de baixo crescimento.
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