O impacto do Covid-19 no mercado de transportes
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*Por Raquel Serini

Todos nós tínhamos planos, até sermos pegos de surpresa com essa crise, não é mesmo? De forma geral, a ameaça do Covid-19 traz reflexos no mercado global, inclusive para o setor de transporte rodoviário de cargas. E, nesse contexto, o empresário vem enfrentando diferentes cenários: oscilações na demanda, queda de faturamento, mudanças nas relações de trabalho, além das incertezas de recuperação.

Acreditamos que com esses desafios as empresas precisarão inovar, utilizar ferramentas alternativas, ganhar eficiência no processo e recompor o caixa, o que é essencial. Mas esteja certo de que a economia como um todo vai se encaixar em um novo conceito de mercado, alguns setores se consolidarão, outros infelizmente, não. Também irão surgir novos modelos de parceria e de compartilhamento, mudando os parâmetros que conhecemos hoje.

Por isso, seja na crise ou na retomada do crescimento precisamos olhar para dentro das empresas, analisar criteriosamente toda estrutura financeira e buscar novas oportunidades de negócios. Mas para isso, é importante e necessário conhecer o cenário no qual estamos inseridos.

O MERCADO E OS NEGÓCIOS

Atualmente, os números não são animadores para o setor, gostaria muito de trazer uma informação diferente, mas essa é a nossa nova realidade. As medidas restritivas de enfrentamento ao coronavírus impediram a aglomeração de pessoas nas ruas, fecharam o comércio e indicaram o trabalho à distância. Tudo isso, trouxe impacto para o abastecimento da cidade, e consequentemente, para o volume de carga em circulação.

Após sete semanas de monitoramento feito pela NTC&Logística, desde 16 de março a 03 de maio, o número percentual total de queda no volume transportado chegou a 41,41%. Só no mês de abril esse número alcançou a marca de 43,85%.

Para as cargas fracionadas, que contempla operações de coleta e distribuição para pequenos lotes, a pesquisa apontou que a queda de demanda atingiu 43,18%, melhora de cerca de 4 pontos percentuais em relação à semana anterior.

Já para as cargas lotação, que ocupam toda a capacidade dos veículos e são utilizadas especialmente nos segmentos industriais e agrícolas, a retração até a última semana atingia 39,96%, uma melhora de aproximadamente 3 pontos se compararmos a pesquisa passada.

Os cinco estados que mais sofreram com a queda de demanda por carga, foram: Pernambuco 53,8%; Pará 50,5%; Alagoas 49,5%; Mato Grosso do Sul 49,3%; seguido da Bahia 47,4%. Já São Paulo que abrange nossa base territorial, apresentou variação de 46,1% atingindo a oitava posição nesse ranking.

O novo levantamento indicou também que o percentual de empresas que tiveram queda no faturamento em função da pandemia diminuiu, passando de 90% na 6ª semana para 86% na 7ª semana, já que historicamente, essa é a primeira queda desde o início da pesquisa.

RELAÇÕES DE TRABALHO

Desde a confirmação do primeiro caso de Covid-19 no Brasil, em 26 de fevereiro, fomos desafiados a nos adaptar ao modelo de trabalho em casa (home office), postura essa culturalmente pouco adotada pelas transportadoras. Mas isso tudo, com o objetivo de manter maior parte das atividades empresariais e, principalmente, para que não houvesse interrupção na prestação do serviço.

Resultado disso foram as mudanças de comportamento, ações promovidas para preservar o quadro de funcionário e evitar as demissões em grande escala. Em recente estudo divulgado pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), 34,1% das empresas alternaram os funcionários em turnos de trabalho, 32,1% concederam férias coletivas e 29,5% utilizaram banco de horas.

RECURSOS FINANCEIROS

Outro ponto alarmante é o tempo que as empresas conseguem se manter com recursos próprios, apesar de todas as ações administrativas e das políticas de apoio emergencial do governo.

A Pesquisa de Impacto no Transporte Covid-19 (CNT), mostra que as transportadoras afirmaram deter recursos próprios para operar por, no máximo, um mês. Apenas 28,8% têm condições de se manterem em atividade por mais de dois meses sem apoio financeiro. Essa realidade evidencia a urgência de medidas que auxiliem as transportadoras a recompor o caixa para atravessar a crise sem um grande número de falências.

E nós sabemos da dificuldade, na prática, de acessar linhas de crédito para incorporar ao capital de giro das empresas. Isso seria fundamental para amenizar o problema de fluxo de caixa nesse momento. No entanto, 35,4% das empresas participantes da pesquisa alegam que o acesso está mais difícil.

A NOVA REALIDADE

A expectativa é de que o setor sinta uma diminuição tímida dos resultados negativos, acompanhada de um lento crescimento da atividade produtiva. Mas os impactos negativos devem perdurar pelos próximos 4 meses. Na prática, isso mostra que a crise atual foi um banho de água fria para o mercado brasileiro, já que se esperava um ano positivo.

Alguns fatores vão determinar o tempo para a recuperação dessa queda. As principais projeções se baseiam nos países que aparentemente já passaram do pico de casos e começam a voltar às atividades. Isso vai depender também de como vamos conseguir conter o número de casos da doença e desacelerar a transmissão do vírus.

Por isso, acreditamos que para as transportadoras superarem essa crise, é essencial o apoio do governo federal, oferecendo carências estendidas e juros reduzidos para um ganho de fôlego, além da suspensão de algumas cobranças previdenciárias patronais, e até mesmo suspensão de impostos sobre o combustível, insumo tão vital para as atividades de transporte.

 Apesar dos esforços 22,2% das empresas já realizaram demissões, outros 17,8% suspenderam temporariamente os contratos de trabalho e 16,5% não tomou nenhuma das medidas citadas anteriormente.

*Raquel Serini é economista do IPTC.


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