A volatilidade do dólar e o preço do petróleo podem obrigar o governo a fazer uma escolha de Sofia. Ou preserva o consumidor, entre eles, caminhoneiros, que ameaçam parar caso haja aumentos sucessivos do diesel, ou a Petrobras, que baliza o valor dos combustíveis no mercado internacional e na divisa norte-americana.
Questões internas, como a demora nas discussões da reforma de Previdência e a dificuldade do governo de negociar com parlamentares, deixam a moeda norte-americana valorizada em relação ao real, assim como atuação dos Estados Unidos contra o Irã e, atualmente, a crise na Venezuela, elevam o valor do barril de petróleo. Tais questões, segundo especialistas, podem obrigar o governo a tomar uma posição.
Isso porque, apesar de negar que haverá intervenção na política de preços da Petrobras, o presidente Jair Bolsonaro se mostrou sensível às pautas dos caminhoneiros, que já fizeram uma paralisação em maio de 2018. O movimento paralisou o país, resultou na alta da inflação e na diminuição da atividade econômica, com reflexos até hoje.
No mês passado, uma nova insatisfação tomou conta da categoria, inclusive com o anúncio de greve — o que acabou não se concretizando. A alta do diesel mostrou, se não a força dos caminhoneiros, o temor de uma nova greve, e deixou clara a vulnerabilidade da Petrobras em relação ao mercado internacional. Segundo o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Fabio Bentes, a percepção é de que os reajustes dos preços serão menos frequentes, o que cria um problema de caixa para a estatal.
Desde o início de março, o preço do petróleo aumentou mais de 10%. O barril tipo brent passou de US$ 72. A volatilidade acaba sendo o grande problema. Enquanto em outubro de 2018, o valor chegou a US$ 85, em dezembro diminuiu para US$ 50. Nesse período de queda, houve redução do custo nas refinarias da Petrobras, mas, desde o início do ano, o movimento foi o contrário.
Defasagem
Há possibilidade de que o petróleo suba para além de US$ 75, a depender da oferta do produto no mundo. Segundo uma pesquisa da Reuters, a produção das nações da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) foi a menor para o mês de abril em quatro anos, o que contribui para elevar o preço. “Além disso, o dólar está cristalizado entre R$ 3,80 e R$ 3,90. É difícil saber o que será feito, em função da comunicação precária e das surpresas dentro do próprio governo. Parece-me que a empresa tende a ser mais afetada por essa percepção de que os reajustes serão represados. Até porque, entramos numa fase delicada do ano, em que vai ser determinante o comportamento da taxa de câmbio em relação ao andamento da reforma da Previdência”, destacou Bentes.
Para o sócio-fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (Cbie), Adriano Pires, a questão da Petrobras é mais complicada, pois as últimas correções feitas pela estatal nos preços não suprem a diferença entre os mercados internacional e o interno. “Ainda tem defasagem na gasolina, impedindo que haja importação por parte dos agentes privados”, ponderou. “O petróleo tem alta volatilidade, e o câmbio no Brasil, também. Essa confusão (de intervenção) existe em qualquer governo. A gente tem que ousar e tentar mudar essa lógica”, sustentou.
De um lado, a Petrobras pode ser sacrificada para evitar possível greve dos caminhoneiros — o que afetaria o PIB do país novamente —, mas, de outro, a estatal perderia investimentos de acionistas, que não sentiriam atratividade numa empresa com risco de prejuízos. Ainda mais num momento em que o governo federal não tem condições de subsidiar as perdas no caixa da empresa.
Imposto
Para Pires, há duas alternativas para equacionar a política de preços da Petrobras e evitar interferências do governo no diesel ou mesmo na gasolina. Uma delas é a proposta de um fundo de estabilidade que utilize recursos excedentes dos royalties do petróleo para criar uma espécie de colchão que atenue ou até neutralize o aumento do preço do petróleo no mercado externo. Outra sugestão de Pires é criar um “imposto flex” sobre o PIS/Cofins, de modo que o governo reduza a tributação à medida que a Petrobras propuser reajustes. Sugestão semelhante vem sendo ventilada pela equipe econômica para a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), de maneira a elevar a alíquota para equilibrar eventuais reajustes.
Enquanto caminhoneiros dão um voto de confiança ao governo de que algumas reivindicações, fora o valor do combustível, serão cumpridas, cancelando a paralisação, motoristas que dependem dos veículos para sobreviver reclamam.
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