Há três anos, o roubo de cargas no Rio de Janeiro somava pouco mais de 3 mil casos por ano. De dois anos para cá, a modalidade criminosa dobrou, batendo em mais de 7 mil casos, com estimativa de ultrapassar os 8 mil casos até o final de 2016 (um aumento de 14%). Para o diretor de segurança do Sindicato das Empresas do Transporte Rodoviário de Cargas e Logística do Rio de Janeiro (Sindicarga), Coronel Venâncio Alves de Moura, o cenário tende a ser ainda pior – ele aposta em um aumento de mais de 20%. Para efeito de comparação, em São Paulo, a estimativa é que o aumento seja de 8%.
Mas por que o cenário é tão pessimista no Rio de Janeiro? “O que acontece no Rio não acontece em nenhuma outra localidade do País. O roubo de cargas virou uma diversificação dos negócios do narcotráfico”, afirma Moura.
Conforme avalia o especialista, o programa das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), da Secretaria Estadual de Segurança do Rio de Janeiro, que tinha por meta desarticular quadrilhas que ocupavam as comunidades, só serviu para “mudar o endereço dos traficantes” e aumentar os índices do roubo de cargas. “Com a UPP, houve certa inibição ao narcotráfico, e o roubo de cargas se mostrou uma alternativa interessante para esses criminosos porque, diferentemente do assalto a banco ou do sequestro, tem muito valor agregado e liquidez”, avalia. “O traficante consegue, em média, uns R$ 50 mil por dia sem muito esforço”, revela. Ele explica que, com uso de jammers, os criminosos embaralham o sinal do rastreamento e impedem o bloqueamento dos caminhões. Como os motoristas não têm condição de reagir a assaltantes fortemente armados, o “negócio” mostrou-se “fácil”.
A Rodovia Presidente Dutra é o local onde acontece a maioria dos ataques. Os criminosos agem principalmente no quilômetro 166, na altura da Pavuna, zona norte da capital. A região é considerada rota de fuga para as comunidades do Chapadão, Pedreira, Costa Barros e Barros Filho. As cargas roubadas são levadas para a área dominada pelo tráfico de drogas. Os caminhões mais visados são os que transportam, nesta ordem: carnes, bebidas, eletroeletrônicos e cigarros. “Até mesmo o perfil da carga roubada mudou. Cigarro sempre foi o item mais visado. Agora, são alimentos e bebidas que, na maioria das vezes, são distribuídos e revendidos na própria comunidade”, avalia Moura, ressaltando, porém, que o roubo de cargas com maior valor, como caminhões frigoríficos com mais de R$ 700 mil em produtos a bordo, vem sendo registrado, o que aponta uma possível organização maior do crime, com a existência de receptadores.
Com este cenário, instalou- -se o pânico em todo o setor de transporte rodoviário de cargas, o que, na pior das hipóteses, pode gerar uma crise de abastecimento na cidade. “Os transportadores estão se recusando a atuar na região, os motoristas estão com medo de morrer, as seguradoras estão recusando seguro, as empresas estão deixando a cidade, até porque, paralelamente, o tráfico vem cobrando uma espécie de pedágio dos empresários. Quem não aceita pagar é assaltado”, denuncia.
E há solução para o problema? “Só quando o poder público decidir acabar com ele. Mas, até aqui, parece que a intenção é manter as UPPs como se fossem solução, e elas só serviram para tirar o bandido de um lugar e levá-lo para outro”, condena Moura.
Cenário em São Paulo
Em São Paulo, que teve registro maior do que o Rio de Janeiro ano passado em casos de roubo de cargas (8.490 contra 7.225 ocorrências), a tendência é de aumento de 8% este ano. Mas, conforme afirma o Coronel Paulo Roberto de Souza, assessor de segurança da Associação Nacional do Transporte de Cargas & Logística (NTC&Logística), apesar de grave e alto, o índice é estável.
“Ao final de 2015, o total de ocorrências no Brasil todo foi de 19.250, sendo que São Paulo e Rio de Janeiro somavam 82% delas. Isto significa que, a cada cinco casos de roubo de cargas, quatro acontecem entre Rio e São Paulo. É uma coisa estratosférica”, avalia. “Porém, o que acontece no Rio de Janeiro é muito particular, porque lá a polícia não tem condições de agir. O crime organizado que domina os morros descobriu no roubo de carga uma fonte de dinheiro. Eles vendem a preços baratos, doam para a comunidade para ganhar a simpatia dos moradores. A polícia, se não estiver com veículos blindados, não sobe o morro, porque vai ser metralhada. Em São Paulo, apesar da gravidade do crime, não tem lugar onde a polícia não possa entrar”, completa.
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